São Paulo, Sexta-feira, 04 de Junho de 1999
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Ricardo Castro prova sua maturidade com Chopin

especial para a Folha

A certa altura de suas carreiras, todos os pianistas se vêem compelidos a enfrentar um "recital Chopin". Como mestre supremo do piano, Chopin soube explorar como ninguém todas as possibilidades expressivas e técnicas de seu instrumento e nos legou uma obra totalmente dedicada a ele.
Sob os títulos genéricos de "Estudo", "Balada", "Valsa", "Noturno" ou "Polonaise", Chopin teceu poemas sonoros onde desvelava seus sonhos e visões e atingia um grau insuperável de perfeição técnica.
Já Rubinstein havia dito que a música de Chopin possui um apelo universal: ela é imediatamente reconhecida e conquista os mais diferentes auditórios. Tendo passado por suas mãos e pelas de Horowitz, Pollini, Argerich, Arrau e outros, a música de Chopin torna-se um desafio muito maior abordá-la nos dias de hoje.
O "recital Chopin" seria assim o atestado de maioridade de um pianista. E requer dele, além de apuro técnico, plena maturidade emocional e grande sensibilidade poética.
Ricardo Castro, em seu novo CD, mostra que tem todos os predicados para vencer esse desafio. Virtuosismo, precisão do toque e fidelidade à partitura são apenas os requisitos mínimos necessários para fazer florescer toda a magia e a poesia da arte de Chopin.
Ao contrário dos pianistas da nova geração, como Kissin e Pletnev, que se concentram quase que exclusivamente nos aspectos técnicos e virtuosísticos, Castro nos apresenta um Chopin imaginativo e criativo, herdeiro das lições dos grandes mestres.
A sua busca é pela expressividade e riqueza do tecido sonoro, e nele o virtuosismo se subordina aos fatores puramente musicais.
Sua interpretação das "Baladas nºs 3 e 4" nada deixa a dever às melhores gravações de que dispomos, e se caracteriza pela fluência da linha melódica e convincente apelo dramático.
A "Polonaise op. 53" é executada de maneira realmente "heróica", enquanto que nas "Valsas op. 64" ele revive o "Chopin de salão", despreocupado e ligeiro. Sua versão da tão visitada "Sonata nº 2 op. 35" revela que sempre há algo de novo a ser dito em Chopin.
Neste caso, sua interpretação prima pelo despojamento e simplicidade, e principalmente pela desmistificação da sua famosa "Marcha Fúnebre", que é apresentada de uma maneira sóbria e elegante, quase clássica.
Castro já havia revelado o seu Chopin intimista e melancólico ao gravar, em 1995, a integral dos "Noturnos". Nas quatro peças aqui apresentadas, ele confirma sua vocação para o gênero, e elas atestam o refinamento e a originalidade de suas interpretações.
Mesmo sendo herdeiro de uma vasta tradição fonográfica, que inclui os maiores pianistas do século, Ricardo Castro se revela com o seu Chopin não só pelo apuro técnico, mas principalmente pela sinceridade de suas interpretações.
Com este CD ele prova assim que atingiu a maturidade de seu pianismo.
(WL)


Avaliação:


Disco: Ricardo Castro interpreta Chopin Lançamento: BMG Quanto: R$ 20 (em média)


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