Separação inspirou show de hoje no Sesc Pinheiros

SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL

"El velo semitransparente del desasosiego, un día se vino a instalar entre el mundo y mis ojos." Além de ser poeta, é preciso estar um tanto triste para tirar da cartola versos como esses, da canção "La Vida Es Más Compleja de lo que Parece".
Pois era assim que Jorge Drexler, 42, que se apresenta hoje em São Paulo, estava se sentindo quando gravou "12 Segundos de Oscuridad", lançado por aqui no ano passado.
Uma tremenda fossa amorosa, causada por uma separação, levou o músico a dar um tempo. Escolheu Cabo Polônio, uma vila situada numa bela praia no litoral do Uruguai, em que a vista é dominada por um farol e pela presença de uma colônia de leões-marinhos. Sem sinal de celular e desconectado do mundo, passou noites observando o intervalo de tempo que levava o farol do local para dar uma volta completa (os tais 12 segundos).
Dali surgiram as idéias para boa parte do repertório do álbum. "Esse é um trabalho de incorporação de um monte de situações emocionais vividas ao mesmo tempo", contou à Folha, por telefone.
Depois do sucesso internacional de "Eco" (2004) e do Oscar que ganhou por conta de "Al Otro Lado del Río", música de "Diários de Motocicleta" (do brasileiro Walter Salles), Drexler disse que se sentiu acuado do ponto de vista criativo, sem saber se usava a popularidade para fazer algo mais comercial e abrangente ou se apostava num trabalho autoral.
"Eu estava sendo levado a realizar um movimento midiático por causa de um sucesso midiático. Mas, em vez disso, preferi fazer um movimento artístico, e o resultado disso foi "12 Segundos". Foi um ato de sinceridade pessoal", diz.
Hoje, Drexler diz que seu coração já está recuperado do baque e que por isso o show será mais "alegrinho". "Eu estava num momento de dor profunda. O disco foi uma espécie de "statement" artístico e pessoal.
Mas tudo aquilo ficou lá. Agora, no show, eu estou num outro momento."
No set list estão músicas de alguns de seus sete discos anteriores, como "Eco", "Deseo", "Milonga del Moro Judio", "La Edad del Cielo", entre outros.
A relação com os amigos músicos brasileiros continua sendo prioridade na agenda do músico. Depois de ter a companhia de artistas como Arnaldo Antunes, Maria Rita e Vitor Ramil em "12 Segundos de Oscuridad", Drexler agora ensaia trabalhos com Lenine, Ivan Lins e Marcos Suzano.
Apesar de passados os maus momentos, Drexler continua tendo a melancolia como principal assunto.
"Eu sou uma pessoa que sempre sentiu saudades na vida. Deixei o Uruguai há muitos anos para viver na Espanha, voltei, depois continuei viajando muito. Estou sempre longe de alguém querido. Isso vai estar sempre na minha música."