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MÚSICA ERUDITA
Maestro catalão e virtuose da viola de gamba se apresenta em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Curitiba, com o grupo Hespèrion XX
Savall toca mitologia e humanismo musical
IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha
O músico catalão Jordi Savall, 53,
apresenta-se em São Paulo em 22
de outubro, no Cultura Artística.
Savall, que também toca no Rio
(dia 23) e em Curitiba (dia 25), é,
além de maestro, um virtuose da
viola de gamba -a viola renascentista, que leva este nome ("viola
de perna") por ser apoiada entre
as pernas do executante.
Regente do conjunto vocal La
Capella Reial de Catalunya e da orquestra Le Concert des Nations,
Savall traz nessa turnê o mesmo
grupo que o acompanhou ao Brasil
em 95 -o Hespèrion XX, em que
brilha sua esposa, a soprano
Montserrat Figueras, ao lado de
quatro cantores e um pequeno
conjunto instrumental.
Em São Paulo e no Rio, o grupo
interpreta um programa intitulado "Música e Mitologia", com
obras de Monteverdi, Luigi Rossi e
Tarquino Merula, entre outros autores do período entre 1580-1650
que trabalharam com textos baseados em temas mitológicos.
Já Curitiba assiste "O Humanismo Musical", uma contraposição
à mitologia que vai do século 14 até
1580 e complementa o outro programa, com obras de Juan del Encina, Mateo Flecha e vários autores
anônimos.
Savall falou com exclusividade à
Folha, por telefone, de sua casa,
em Barcelona (Espanha).
Folha - Como o sr. divide o tempo entre a carreira de regente e a
de solista?
Jordi Savall - Procurando não
fazer as duas coisas ao mesmo
tempo (risos). Neste mês, tenho
várias atividades, como solista e
como regente. Cada mês é realizado de acordo com um plano, no
qual procuro, entre os cem concertos que fazemos por ano, cobrir
os diferentes campos que me interessam divulgar ao público.
Folha - Sua gravadora, a Auvidis,
criou um selo novo chamado Fontalis. Qual sua participação nele?
Savall - É um projeto que criei e
propus à Auvidis para dar coerência à nossa produção de quase 80
discos, que ficavam diluídos dentro da enorme quantidade de lançamentos do selo Astrée.
Folha - O sr. também atua como
produtor?
Savall - Sou um pouco produtor de meus discos, no sentido de
que praticamente todo o projeto
musical cai em minhas mãos
-desde a busca do programa até a
edição do disco. Mas é sempre a
Auvidis que edita o disco.
Folha - Quais seus novos projetos
de gravação?
Savall - Além da trilha do filme
"O Marquês", há um projeto de
música francesa do século 17 e
"The Fairy Queen", de Purcell.
Folha - O sr. gravou a "Sinfonia
nº 3", de Beethoven. Há planos de
fazer outras coisas do compositor?
Savall - Sim, mas para 98 e 99.
Folha - Que leitura um músico
que sempre trabalhou com a música medieval e barroca pode trazer
para a música do século 19?
Savall - Ler a partitura e realmente buscar, independentemente da tradição atual, a idéia que o
compositor teve desta música.
Folha - A interpretação tradicional está muito distante das idéias
originais de Beethoven?
Savall - Certamente, porque o
peso de tantos anos de tradição
modificou muitos parâmetros.
Folha - O que é possível recuperar dessas idéias originais?
Savall - Uma ampla visão das
cores da orquestra, que eram muito mais variadas. Flautas, clarinetes e oboés eram de madeira, os
instrumentos de metal tinham um
som mais interessante, que se
mesclava melhor com os instrumentos de corda -os quais, por
sua vez, tinham cordas de tripa e
utilizavam os arcos e cores que os
compositores haviam imaginado.
Dizem hoje que, se Bach tivesse
conhecido o piano moderno, o teria preferido em relação ao cravo.
Isso tem um aspecto de verdade,
mas também um aspecto demagógico.
Se Bach tivesse conhecido o piano, talvez tivesse composto uma
música mais próxima da de Beethoven do que da sua própria.
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