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Saura filmará música brasileira
Em aula no Rio, diretor espanhol conta que incluirá ritmos nacionais em sua próxima produção
Cineasta registrou diversos bailes do Rio para usar na pesquisa de seu próximo filme, "Amor de Deus", que terá roteiro de Karim Aïnouz
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
O cineasta espanhol Carlos
Saura se preparou para deixar
ontem o Brasil, por pouco tempo. Em julho do ano que vem
ele pretende estar de volta, para filmar "Amor de Deus", longa-metragem musical dedicado
a ritmos brasileiros.
Em sua temporada como
convidado do Festival do Rio,
onde deu uma aula magna de
cinema, Saura, 74, aproveitou
para visitar bailes e registrá-los
em fotos e com câmera portátil.
O diretor retorna à Espanha,
pensando em "como ajustar esses bailes ao roteiro do filme",
que será assinado pelo diretor
brasileiro Karim Aïnouz.
Aïnouz disputa a Première
Brasil do Festival do Rio com
seu segundo longa, "O Céu de
Suely". Saura disse que assistiu
apenas ao filme de estréia do
diretor brasileiro -"Madame
Satã" (2002)-, com quem se
encontrou em Madri, para
acertar o projeto conjunto. "É
um homem muito talentoso e
nos entendemos muito bem."
A uma platéia de cinéfilos
que acompanhou sua aula magna, no Cine Odeon, na segunda,
Saura, autor de clássicos como
"Carmem" (1983) e de filmes
que abordam a música como
"Tango" (1998), falou da importância da música no cinema.
"Vejo todos os tipos de filmes, mas sobretudo comédias
americanas. Nesses filmes, a
música persegue os personagens. Não suporto isso. Usa-se
muito a música no cinema, mas
de modo regular ou ruim."
O diretor contou uma anedota sobre seu conterrâneo Luiz
Buñuel (1900-1983). "Ele dizia
que não tinha interesse pela
música no cinema, mas Buñuel
estava surdo. E era mentira,
porque, num filme de 1932, ele
usou um trecho inteiro de
Brahms", citou, assinalando a
admiração pelo mestre.
"Se tivesse que escolher um
mestre, escolheria três: Buñuel,
[o sueco Ingmar] Bergman e [o
italiano Federico] Fellini. Cada
um deles usou a imaginação no
cinema segundo a sua cultura."
Amigo do cubano Tomás Gutierrez Alea, o Titón, Saura contou que esteve "a ponto de ir viver em Cuba", quando seu primeiro filme foi censurado na
Espanha. "Mas eu queria falar
do meu país e das pessoas do
meu país." Desistiu de emigrar
e acha que "estar aqui, hoje,
com vocês, depois de quase 40
filmes, parece um milagre".
"Fotógrafo compulsivo",
Saura contou que, "por amor a
uma menina", foi atraído para a
fotografia e, desta, ao cinema:
"Ela tinha 7 anos, e eu, 9. Não
podia dormir de paixão. Como
eu era muito tímido, não me
atrevia a falar com ela. Peguei a
câmera do meu pai, que era um
péssimo fotógrafo, suas fotos
saíam invariavelmente desfocadas. Escondido, fiz uma foto
dela -vejam que já era meio
voyeur- e até que não saiu mal.
Desenhei um coração flechado
atrás da foto e enviei-a para ela.
Ela nunca me respondeu. Mas
pelo menos eu comecei assim."
Sobre a produção atual de cinema, disse que, "com os avanços técnicos, qualquer um pode
fazer um filme. O problema não
são mais os meios, mas o talento" e defendeu que os cineastas
busquem "se não um caminho
diferente, pelo menos próprio".
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