São Paulo, quarta, 5 de fevereiro de 1997.

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MÚSICA ERUDITA
Gravadoras despejam discos por R$ 12

IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha

A música erudita quer pegar o consumidor pelo bolso. A principal estratégia das gravadoras para ampliar o mercado são as séries "budget price" -discos que custam, para o consumidor final, cerca de R$ 12.
Comum no Reino Unido, a faixa de preço "budget price" é novidade no Brasil. Começou no segundo semestre de 96, quando PolyGram e EMI, líderes do mercado, lançaram, respectivamente, as séries "Galleria" (Deutsche Grammophon) e "Gold Classics", contendo gravações antigas de intérpretes renomados.
"Antigamente, os únicos discos clássicos baratos que havia nas lojas eram de má qualidade", afirma Cláudio Rabello, gerente de clássicos e jazz da PolyGram. "O consumidor se sentia logrado e acabava ficando desestimulado."
As outras gravadoras, como a Sony, prometem investir na linha "bom e barato". Além de lançamento de séries "budget", a terceira colocada no mercado nacional se preocupa com o marketing direto. "Há poucas lojas especializadas no Brasil. A gravadora tem que ter uma maneira de chegar diretamente ao consumidor de clássicos", afirma Daniela Boclin, do marketing especial da Sony.
A BMG, que tem tido boas vendas com as compilações da série "Greatest Hits", pretende trazer ao Brasil, a "budget price", os lançamentos do selo Artenova. E a Warner prepara uma nova roupagem para a "Erato Collection".
Trata-se de uma coleção do selo Erato, com gravações de intérpretes renomados, como a pianista portuguesa Maria-João Pires.
Em âmbito internacional, o lançamento de séries "budget" é uma reação das grandes gravadoras contra a Naxos -pequeno selo de Hong Kong que, nos últimos seis anos, com gravações boas de intérpretes desconhecidos e preços muito baixos, conseguiu se firmar como o sexto do mundo, com vendas em todo o planeta, Brasil inclusive.
Mercado
O último grande "boom" do mercado clássico brasileiro aconteceu em 94, quando o segundo disco dos "Três Tenores" vendeu 620 mil cópias.
Depois, houve queda acentuada nas vendas de LPs e fitas cassete e crescimento no setor de CDs, mas ainda insuficiente para atingir os números daquele ano.
Em 96, de acordo com a ABPD (Associação Brasileira dos Produtores de Disco), o mercado clássico cresceu 25,13% -índice que ficou abaixo da média geral, 31,5%.
"O grande estouro foi a época em que todo mundo começou a substituir os LPs clássicos por CDs", afirma Amir Harif, gerente de clássicos da BMG. "Isso já passou. Agora, o crescimento tende a ser mais estável."
Fora do Brasil, há quem projete cenários negros para o mercado erudito de CDs. Lançado no Reino Unido em 96, pela editora Simon & Schuster, causou furor o livro "When the Music Stops", de Norman Lebrecht.
"Os clássicos representaram 6% das vendas de discos no Reino Unido no ano passado, e 4% no mundo -houve uma época em que eles comandaram um quarto do mercado", escreveu Lebrecht, em artigo recentemente publicado na revista "Classic CD".
"When the Music Stops" denuncia o que ele chama de "coca-colização" da música, transformada em produto dominado pela ganância das corporações e de um "star system" dominado por cachês elevadíssimos que ninguém mais consegue pagar.
A invenção do CD estaria, para Lebrecht, apressando o colapso do sistema. Afinal, se você tem uma gravação das sinfonias de Beethoven da qual gosta, com som perfeito, que vai durar para sempre, por que adquirir outras?
Por isso, de acordo com o autor, quaisquer números de crescimento do mercado são enganosos, pois estariam sendo puxados por títulos "crossover" como "Três Tenores" ou Vanessa Mae, que mais têm a ver com o pop que com a música erudita.

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