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CRÍTICA
"BBB6", ou a falta que faz a literatura
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
É a esta altura que os "Big
Brother" costumam começar a pegar -mas, por ora, não
há sinais de que isso possa chegar
a acontecer nesta edição. Há quase um mês no ar, com três participantes já eliminados e à beira
da quarto paredão, o programa
parece estar fazendo água.
Não por falta de tentativa, algumas, dizem por aí, incentivadas
pela produção do programa. Até
agora, o "reality show" já teve
dois namoros -protagonizados
pelo mesmo bonitão- e dois
"rompimentos", várias bebedeiras, acompanhadas do habitual
descontrole afetivo-sexual decorrente do excesso de álcool,
muita nudez física e muita mesquinharia, burrice, mediocridade, estupidez desnudadas diante
das câmeras.
Os personagens parecem um
pot-pourri de outras edições: entre os 14 deste ano, detectam-se
com mais ou menos facilidade tipos que já estiveram naquele microcosmo. Qualquer um poderia, em tese, embarcar nas convenções que estão em jogo
-bem contra o mal, relações intensas nascidas da adversidade, o
pobre que vira rico como que por
encanto, o espertalhão que faz
todos de bobos e se dá bem, a
pérfida criadora de cizânia.
Ou seja, os elementos todos estão lá, mas o roteiro empaca. Não
vai. Pelo menos por enquanto,
ainda não foi.
Embora todos os participantes
estejam perfeitamente familiarizados com o programa e sua história (no site da Globo.com dedicado ao programa, entre os tópicos que fazem o perfil dos participantes há o "BBB favorito", ou
seja, o participante-modelo das
edições anteriores), eles hesitam.
O sucesso de um BBB, a julgar
pelos que precederam esse sexto,
depende muito da capacidade de
seus participantes engendrarem
uma narrativa coletiva. Chama-se "reality show", a coisa se apresenta em forma de um jogo com
um prêmio gordo ao final, mas a
capacidade de encantar -e
atrair muita audiência- reside
em um lugar muito diferente
tanto da "realidade" quanto da
competição. Claro que ambas
têm papel muito importante na
construção ficcional, mas a história que se pretende contar nos
BBBs, quando existe, vai além
disso.
Na maioria das vezes, alguém
puxa para si o papel de "autor"
dessa narrativa, em torno do
qual se organizam os outros
"personagens".
O "autor" emerge de uma dupla condição: a personalidade
com algum relevo e um repertório ficcional, mínimo que seja,
que permite tecer os fios da trama.
Desta vez, não parece haver nenhum autor entre os 14 que iniciaram. O monge é falso, dos pés
à cabeça. Assim como a psicóloga, embaraçada por demais em
suas platitudes. Os pobres simpáticos são pobres e simpáticos,
mas já longe demais do realismo
"genuíno".
O resto é gente sem história,
sem memória, sem dimensão alguma para além daquelas conferidas pela malhação.
@ - biabramo.tv@uol.com.br
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