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MÚSICA/LANÇAMENTOS
VANGUARDA PAULISTANA
Grupo se reúne para comemorar os 30 anos de formação com três shows no Sesc Pompéia
"Não-canções" do Rumo ganham reedição
DA REPORTAGEM LOCAL
Um dos baluartes da vanguarda musical paulistana da virada dos anos 70 para os 80, o Rumo está temporariamente reunido. A comemoração dos 30 anos
de formação do grupo acontecerá
entre os próximos dias 19 e 21, em
três shows no Sesc Pompéia. Mas
a temporada de revisão já começou, com a reedição em CD de sua
obra discográfica completa.
O Rumo era exemplar do que se
apelidou vanguarda paulistana
por vários motivos. Formado em
1974, não empolgou ninguém na
indústria fonográfica -demorou
sete anos para ser gravado em disco, e o fez de modo independente.
Embora não se caracterizasse
um movimento, estava sintonizado com o imaginário dos ideólogos da tal vanguarda, Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção. A voz
de Ná Ozzetti aproximava o canto
do Rumo da identidade das agudas vocalistas de Arrigo e Itamar.
Às vezes também se rendia a um
tipo de humor afinado com o do
Premeditando o Breque, que
pressentia a chegada da fatia mais
pop da geração roqueira dos anos
80 -nesses momentos, era o irmão mais velho (e rebelde, anticomercial) da Blitz.
Propunha atualizar o tropicalismo à moda paulistana, revendo o
cancioneiro do passado e tentando criar uma nova metodologia
sonora. Luiz Tatit, acadêmico e
pensador de música, sublinhava a
presença intelectual do Rumo.
Seguindo em ziguezague os passos da tropicália, o grupo estreou
em 81 com dois discos simultâneos. Um era de produção autoral
inédita do grande grupo de dez
artistas, onde estavam também
Paulo Tatit, Hélio Ziskind, Zecarlos Ribeiro e o também fotógrafo
Gal Oppido, entre outros.
O outro, "Rumo aos Antigos",
relia de modo muito particular algumas das melhores entre as criações fundadoras de compositores
como Noel Rosa, Lamartine Babo, Sinhô e poucos outros.
"Diletantismo" (83) e "Caprichoso" (85) aprimoraram e deram acabamento ao projeto -em
não muitos anos mais ele estaria
dissolvido, consciente talvez de
que possuía data de validade.
Alargava-se o ideário tropicalista rumo ao passado (Rumo era
samba antigo) e ao futuro (era
também dissonância, canto-fala,
um quase pré-hip hop feito por
universitários de classe média).
Intelectualizado, Rumo era difícil de ouvir. Criou uma linguagem
musical que era quase sempre
fundada na fala cotidiana -muitas de suas criações se faziam assim não-canções, anticanções.
Era um corte até ideológico,
mas aproximava o Rumo das
maiores contradições que sempre
habitaram a cidade de São Paulo.
Quando "canto-falavam", Luiz
Tatit e Ná Ozzetti não raro pareciam estar choramingando, resmungando. Somando a isso a incorporação sempre complicada
da música paulistana ao mercado
fonográfico nacional, o resultado
era a cara de São Paulo: somatória
de queixas, isolamento, aparente
afetação de superioridade.
Eram os modos de defesa da
trupe paulistana, que por baixo
disso esbanjava tino musical, melodias que poderiam soar pegajosas, apreço pela musicalidade fácil
e direta do samba antigo.
Não à toa, o Rumo incorporou a
seu repertório o disco "Quero
Passear" (88), em que destinava
aquelas dificuldades todas ao público infantil. Surpresa: deu certo,
tanto que esse era o único disco
que permanecia em catálogo em
CD, pelo selo Palavra Cantada.
Mais que arqueologia de época,
a reedição da história do Rumo se
presta a fonte de reflexão sobre
quais poderiam ser, hoje e amanhã, os novos rumos dos velhos
fetiches por pop e/ou vanguarda.
O Rumo parece ter passado de
leve por essa história. Perdeu comercialmente das bandas de rock,
quase sempre propositalmente
desleixadas. Restou desconhecido
pela maioria dos brasileiros.
Mas o preciosismo vocal e a
enorme qualidade musical de sua
obra ficaram, sim, como testemunhos. Ficou também a aparente
inadequação à possibilidade de
sucesso comercial, mas isso hoje
antes iguala que diferencia o Rumo da indústria como um todo.
Hoje São Paulo possui grupos
como o Numismata, que não sabe
fazer sucesso e faz rock sobre instrumentos de samba e interpretações vocais cuidadosamente
construídas. Ser roqueiro não é
mais sinônimo de cantar mal ou
ficar rico em dez segundos. Quem
ensinou isso foi, também, o Rumo.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
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