|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"ADORÁVEL COMUNISTA"
A antropologia do consumo baiano
GILBERTO FELISBERTO VASCONCELOS
ESPECIAL PARA A FOLHA
É rico em informação este livro de Antônio Risério sobre
o dúctil e simpático Fernando
Sant'anna, o comunista baiano tio
do compositor Tom Zé, não apenas por revelar a personalidade
do biografado, mas pelas picadas
e veredas abertas à compreensão
da regionalidade nordestina e da
historia do Brasil a partir de Canudos e de "Os Sertões".
O autor focaliza militantes do
partidão em Salvador, cidade que
já recebeu o engraçado epíteto de
"capital soviética" dos trópicos.
No marxismo made in Bahia, ao
lado dos aspectos dramáticos, há
outros pitorescos ligados à particularidade da cor local.
Na Bahia, o materialismo dialético freqüentará cabarés e puteiros, transará candomblés, dançará jazz e será ponta de lança de
músicas norte-americanas.
Lá na Bahia é notória a esquizofrenia entre os intelectuais marxistas e o nacionalismo brasileiro
advindo com a revolução de 30.
Dir-se-ia que na Bahia depois de
1937, os marxistas eram menos
comunistas do que anti-Vargas.
Os marxistas em Salvador morriam mais de amores e admiração
pelo 17 soviético do que pelo trenzinho caipira do Raul Bopp.
Intriga a tibieza do nacionalismo na Bahia marxista. O que aí
pegou fundo é o realce antropológico dado ao afromestiço e ao sincretismo na cultura. A questão é
saber se a base da cultura popular
baiana é realmente africana. Em
1954, os marxistas e comunistas
deixaram o Getúlio Vargas antiimperialista falando sozinho.
Getúlio Vargas, de acordo com
os marxistas baianos, é considerado o grande líder burguês do Brasil moderno. Mas no que tange à
"baianidade", tudo bem. Trata-se
de um valor quase oficial. Isso
ideologicamente vai dar na performática de ACM, o doge enlouquecido pela "baianidade", mas
capacho dos imperialistas, conforme a análise de João Carlos Texeira Gomes, o biógrafo de Gregório de Mattos e de Glauber Rocha. Detalhe interessante é que,
marxista baiano, Glauber Rocha
chorou com o povo na praça da Sé
o trágico 24 de agosto de 1954.
Gilberto Felisberto Vasconcellos é
professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "Glauber Pátria Rocha Livre" (ed.
Senac), entre outros.
Adorável Comunista
Autor: Antônio Risério
Editora: Verbal Editora
Quanto: R$ 39 (324 pgs.)
Texto Anterior: Trecho: de "Memórias de um Gigolô" Próximo Texto: Entrelinhas: Paulicéia desvairada Índice
|