São Paulo, Sábado, 05 de Junho de 1999
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GASTRONOMIA
Cresce no Reino Unido a procura da comida "pura", em combate à geneticamente modificada
"Orgânicos" querem barrar "alimentos Frankenstein"

SYLVIA COLOMBO
de Londres

Parque de Primrose Hill, 16h, tarde de um domingo no começo da primavera londrina, faz sol, temperatura em torno dos 18 graus. Um grupo de jovens com idades entre 25 e 30 anos está sentado na grama. No centro do círculo há sanduíches, frutas, sucos e pratos com frango e queijo.
Um dos rapazes se levanta e começa um discurso. Prega contra o consumo de alimentos transgênicos e elogia o gosto do lanche orgânico que estão saboreando.
O piquenique descrito acima é fruto de uma nova moda gastronômica que invadiu a Inglaterra e se espalha rapidamente por toda a Europa: a alimentação orgânica.
Novos bares e restaurantes orgânicos surgem a cada semana em Londres. A ambientação é moderna e o atendimento é feito por garçons sempre prontos a falar sobre os benefícios da comida orgânica.
Diferente da macrobiótica ou da vegetariana, a alimentação orgânica inclui tudo o que é consumido na cozinha convencional. O que muda é que todos os ingredientes são cultivados, produzidos e processados livres de qualquer químico, conservante ou pesticida (veja ilustração à pág. 4-5).
A alimentação orgânica também inclui carne (frango, boi, porco) desde que os animais tenham sido criados livremente, com o mínimo de cerceamento possível, e alimentados somente com comida orgânica até o abatimento.
A alimentação orgânica ainda é mais cara que a regular, o que ajuda a definir a fatia social que é adepta do novo hábito. Os "orgânicos" são jovens, geralmente entre 25 e 35 anos, de classe média alta e com um bom nível de instrução. São frequentadores ativos da vida cultural da capital britânica.
Entre seus papos preferidos estão a virada do milênio e preocupações com a saúde. "Todo mundo fica curioso para comparar os gostos do orgânico com o regular. Muitas vezes, o orgânico é melhor, mas também há vários casos em que o sabor não muda muito. Comer orgânico não significa comer algo mais gostoso, é comer algo de mais qualidade", diz Ross Doherty, dono do bar e restaurante orgânico Sauce.
Os "orgânicos" fizeram essa opção devido a alguns fatores. Existe uma preocupação ecológica, pois temem que o uso descontrolado de pesticidas cause impacto negativo no meio ambiente.
Também há uma preocupação com os animais. Os manifestos citam os maus-tratos com que são criados como um crime contra a fauna. Dizem ainda que um animal criado preso e estressado gera uma carne de menor qualidade.
Mas a principal preocupação dos "orgânicos" é evitar a proliferação dos transgênicos, alimentos modificados geneticamente pela biotecnologia. A prática científica tem realizado transformações genéticas em sementes com o objetivo de mudar características das plantações, às vezes para torná-las mais resistentes a ações de insetos ou bactérias, outras vezes para alterar o sabor, o tamanho ou a aparência dos alimentos. Os tablóides (jornais sensacionalistas) britânicos apelidaram esse tipo de alimento de "comida Frankenstein".
O que os defensores da comida orgânica consideram é que a biotecnologia ainda não conseguiu provar se os alimentos modificados geneticamente podem ou não ser prejudiciais à saúde.
Vários estudos foram feitos e há muita polêmica na área. Diante da hesitante posição das autoridades científicas, alguns grupos passaram a defender a alimentação orgânica e o banimento de plantações e da venda de transgênicos.
Com a polêmica instalada, o governo inglês determinou que todos os bares e restaurantes fossem obrigados a informar em seus cardápios quais dos pratos contêm ou não transgênicos. Mais um ponto para os "orgânicos", que são apoiados por inúmeras ONGs e associações de direitos humanos.


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