São Paulo, quinta-feira, 05 de julho de 2001

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MÚSICA

Os sons da floresta farão parte do poema sinfônico "Amazonas", que o músico está compondo com Everardo Castro

João Donato "interna-se" na Amazônia

KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM IRANDUBA (AM)

Elaborar um poema sinfônico que misture a modernidade de uma linha de montagem de produtos eletrônicos com o bramir de um casal de onças ou o estrilar dos grilos e das cigarras. É o que busca o pianista e arranjador João Donato, 67, que se "internou" recentemente por sete dias na floresta amazônica em busca de inspiração para sua obra.
Convivendo com árvores gigantescas, pássaros exóticos e passeando de canoa pelos lagos e igarapés do rio Ariaú, Donato está elaborando, em parceria musical com o também compositor Everardo Castro, seu primeiro poema sinfônico, denominado "Amazonas". A obra terá cerca de 50 minutos de duração e arranjos do maestro Laércio de Freitas, da Orquestra Jazz Sinfônica de SP.
"Amazonas" já tem até data marcada para a primeira apresentação: dia 5 de setembro no teatro Amazonas, em Manaus, pois está sendo composto especialmente para um concerto da Amazonas Filarmônica sob a regência de Luiz Fernando Malheiros.
Apesar do nome do poema sinfônico ser semelhante ao da primeira faixa do CD "The Frog" [lançado este ano pela Elephant Records", elaborada em parceria com o seu irmão, Lysias Ênio, na nova obra Donato pretende inserir a essência e a sonoridade da floresta onde nasceu, mais precisamente pelas bandas de Rio Branco, quando a capital do Acre ainda era território do Amazonas.
Donato foi criado até os 11 anos de idade nesse local -tempo suficiente para deixar em sua memória os sons do balançar das águas dos rios, das onças e dos cânticos indígenas.
Sons que Donato e Castro estão coletando agora em pequenos gravadores e que permitirão um retorno às origens amazônicas, transformando-os em notas musicais para compor a obra.
Donato não tinha contato tão próximo com a floresta havia mais de dez anos. As primeiras imagens que viu da mata pela janela do avião, que lhe trouxe do Rio para Manaus, lhe emocionaram. "Quando olhei da janela, vi a grandiosidade do Amazonas, e a emoção me tornou um menino, não parei de registrar as nuvens, a floresta, as águas, as casinhas pequeninas, não tive mais como não registrar com minha máquina fotográfica essa emoção. Acho que é a mesma sensação de um beduíno olhando o deserto, é como voltar ao ventre da minha mãe", diz.
Em Manaus, Donato gravou num zoológico o bramir de um casal de onças, o estrilar dos grilos e das cigarras. Castro foi para uma fábrica de áudio e vídeo onde gravou a sonoridade das linhas de montagem.
"O poema sinfônico vai ter todos esses sons porque representará também a modernidade e o progresso do Amazonas", afirma Castro. "O Donato é amazônico, e eu tenho origem amazônica, meu avô nasceu em Janauacá. Essa idéia do poema sinfônico é, na verdade, um retorno às origens."
"Fico meio extasiado com a floresta, a cor do rio Negro e o barulho dele tocando as margens", disse Donato, durante a viagem de duas horas e meia que fez num barco para chegar ao hotel de selva Ariaú Amazon Towers, a 60 km a oeste de Manaus, onde os artistas ficaram refugiados para realizar a pesquisa musical.
Na floresta, Donato quebrou o costume de acordar tarde e, às 7h30, já estava dentro de uma canoa para visitar os igarapés e depois percorrer as passarelas de madeira do Ariaú para observar os pássaros e as copas das árvores.
"Tenho uma música simples e procuro fazer disso uma poesia, mas não sei articular as palavras, sei articular a música."



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