São Paulo, sexta-feira, 05 de julho de 2002

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Aos 20 anos de carreira, Red Hot Chili Peppers põe o peso de lado e arrisca novas sonoridades

Crise de meia-idade

Ana Carolina Fernandes/Folha Imagem
O cantor Anthony Kiedis em show do Rock In Rio em 2001


CLAUDIA ASSEF
DA REPORTAGEM LOCAL

Dizem que quando a barata se acostuma com o veneno, nada mais consegue matá-la -a não ser uma boa chinelada, claro.
Essa história de baratox cai como uma luva para o Red Hot Chili Peppers em 2002.
Às vésperas de completar 20 anos de estrada, o quarteto californiano lança o oitavo CD da carreira, "By the Way". O disco é prova de que se o "veneno" -no caso, a heroína- não os derrubou, nada mais vai conseguir afetar esses "baratões".
Com o mesmo time e o mesmo produtor (Rick Rubin) do clássico "Blood Sugar Sex Magic", em 91, repete a dose de criatividade e descompromisso com clichês em "By the Way".
Em vez de atacar na linha dos hits macho-funks que ajudaram "Californication", de 99, a vender rios -600 mil cópias no Brasil, 12,5 milhões pelo mundo- os Chili Peppers fizeram um disco improvável, com a marca "Chili Peppers" diluída nos vocais de Anthony Kiedis.
É verdade que em "By the Way", primeiro single do disco, você nem vai sentir tanta diferença: estão ali o baixão característico de Flea, a bateria seca de Chad Smith, a guitarra fraseada de John Frusciante e, principalmente, o vocal anasalado de Kiedis.
Mas aí vem "Universally Speaking", uma delícia que lembra mais a Califórnia dos Beach Boys do que a dos Chili Peppers. Tem coralzinho bem anos 60, cordas, teclado melotron... Ué, o que aconteceu com os meninos?
Um chute óbvio para explicar o novo "approach" é a mudança de atmosfera pela qual os Peppers passaram. Do envolvimento com a heroína, que custou a vida do primeiro guitarrista, Hillel Slovak, em 88, até aqui, a banda esteve várias vezes por um triz.
O último a abandonar a droga -e o que mais intimidade teve com ela- foi o guitarrista John Frusciante, que agora se diz completamente limpo.
Então hoje na banda ninguém mais usa drogas. No lugar delas, da bebida e do cigarro, comida natureba, malhação e ioga. E tem mais: todos, menos Frusciante, estão entrando na casa dos 40.
Então, foi uma crise de meia-idade que trouxe nova sonoridade aos Chili Peppers? Se foi, bem-vindos aos 40, meninos.
Como em "Under the Bridge", que falava sobre o passado junkie de Kiedis, o disco faz referência ao uso de heroína. Segundo contaram à revista inglesa "Q", é uma maneira de exorcizar o passado.
Assim nasceram versos de "This Is the Place": "Aqui é o lugar onde os viciados vão/Onde o tempo passa rápido/Mas as coisas ficam lentas".
Em "Dosed", guitarras doces e vocais sobrepostos sugerem que a ioga e/ou a sobriedade fizeram o Peppers trocar funk-testosterona por um semimantra pop.
Antes de "By the Way", ninguém duvidaria da habilidade como instrumentistas dos Chili Peppers. Mas aqui há mais que isso. Um exemplo é a preocupação com os backing vocals, como fica evidente na ensolarada "Zephyr Song".
As palavras de ordem dos Peppers de 2002 também mudaram. Se antes transformavam odes à bagunça em hino ("Give it Away", "Fight Like a Brave"), agora que a adolescência se foi preferem declarações de amor ("I Could Die for You" e " "Don't Forget me") e de guerra ao consumismo ("Throw away your Television", ou "jogue fora a sua TV").
Já no final do disco, "Minor Thing" evoca sutilmente The Mamas & the Papas. E "Warm Tape" começa com teclados que lembram o Cure da fase mais dark. Então, não dizem que a vida começa aos 40?


By The Way     
Artista: Red Hot Chili Peppers
Lançamento: Warner
Quanto: R$ 27, em média



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