São Paulo, sexta-feira, 05 de agosto de 2005

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CRÍTICA

Exposição reduz importância de artistas a dados biográficos

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Qual a importância da biografia de um artista para a fruição de sua obra? A exposição "Dor, Forma, Beleza", em cartaz na Estação Pinacoteca, parte de um pressuposto perigoso: a explicação de várias obras a partir de dados pessoais dos artistas.
Será legítimo reduzir a importância do trabalho de Leonilson (1957-1993) à contração da Aids pelo artista? Ou mesmo Farnese de Andrade (1926-1996) ser considerado um "portador de deficiência bipolar (a antiga psicose maníaco depressiva) que necessitava da arte para manter-se em equilíbrio", como os curadores Olívio Tavares de Araújo e Leopoldo Nosek afirmam nos textos de parede da mostra?
Segundo essa concepção, há uma redução limitadora da criação e, pior, os trabalhos passam a se tornar ilustração dos dilemas individuais, o que é, sem dúvida, uma maneira enviesada de compreensão da arte. A arte não se comunica porque trata de uma questão individual, mas porque é ampla o suficiente para tratar de temas que vão muito além de mero individualismo.
Há momentos na exposição que se tornam cômicos, quando os curadores não conseguem vincular vida e obra, como nos casos de Flávio Shiró e Ivan Serpa. Sobre Shiró está escrito que embora ele "não tenha os traços da personalidade de Farnese e seja uma pessoa amena, sem nenhuma neurose visível, é um ser pensante e angustiado, consistente, inteligente". E de Serpa, sobre sua estonteante Série Negra, que não se sabe que tenha sido realizada em um "momento difícil do artista".
Portanto, é preciso passar pela exposição sem levar a sério as leituras propostas pelos curadores, pois, no final das contas, a exposição traz um percurso instigante da produção brasileira nos últimos 40 anos, a começar pelo primeiro segmento, dedicado a questões político-sociais.
Lá, são apresentados trabalhos dos anos 60 e 70, como registros de performances realizadas na mostra "Do Corpo à Terra", em Belo Horizonte, em 1970: "Tiradentes: Totem-Monumento", de Cildo Meireles, e as "Trouxas Ensangüentadas", de Artur Barrio, obras já icônicas da produção nacional. No mesmo segmento, Meireles comparece ainda com "Strictu" (1999), uma instalação interativa, sobre a Ku Klux Klan, na qual visitantes podem se algemar e caminhar pelo espaço.
O segmento seguinte, um tanto mais confuso, pois o que mais se busca é explicar obras a partir de dados biográficos, trata do uso de questões individuais como inspiração para a produção artística, onde estão Leonilson, Farnese, Ivan Serpa e Iberê Camargo.
Finalmente, a última seção aborda a produção recente de jovens artistas que tratam do corpo em sua obra, sem dúvida um assunto recorrente nesta geração, que inclui Cris Bierrenbach, Rafael Assef, Amilcar Packer, Nazareth Pacheco e Suzi Okamato. O que dizem os textos sobre esses artistas? Como diria Bartleby, o escrivão, acho melhor não ler.


Dor, Forma e Beleza
  
Onde: Estação Pinacoteca (largo General Osório, 66, Luz, SP, tel. 0/xx/11/3337-0185)
Quando: de ter. a dom., das 10h às 18h; até 4/9
Quanto: R$ 4 (grátis aos sábados)


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