São Paulo, sexta, 5 de setembro de 1997.



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Filme tem arsenal de efeitos

especial para a Folha

Uma das características mais marcantes da linguagem visual de "Cidadão Kane" é a célebre profundidade de campo conse guida pelo diretor de fotografia Gregg Toland, que permitia a convivência de até três planos de ação na mesma tomada.
"Cidadão Kane: O Making Of" mostra, entretanto, que muitas das cenas filmadas apa rentemente com foco profun do são, na verdade, fruto de en genhosos efeitos de câmera ou de pós-produção.
O exemplo mais notável é o da tentativa de suicídio de Su san, a segunda mulher de Kane.
Em primeiro plano, aparece um vidro de remédio vazio so bre uma mesinha; em plano in termediário, Susan jaz desfale cida na cama; ao fundo, Kane e um empregado arrombam a porta e entram no quarto.
O grande crítico francês An dré Bazin exaltava esse mo mento do filme por conter, nu ma única tomada, uma narrati va lógica de causa e efeito, e ci tava-o como exemplo de realis mo cinematográfico, pois res peitava a continuidade de espa ço e tempo, ao contrário da montagem tradicional.
Robert Carringer mostra que, se Bazin acertou no ataca do, errou no varejo, pois a ce na, tal como a vemos, é produ to de um truque ilusionista.
Eis, no livro, a descrição do procedimento: "De início, o primeiro plano foi iluminado e focalizado, e filmado com o plano de fundo obscurecido. Depois, o primeiro plano foi obscurecido, o fundo ilumina do, a lente reajustada, o filme rebobinado, e a cena refilma da." Ou seja: em vez de pro fundidade de campo, o que há é uma imperceptível sobreposi ção de duas imagens.
Outra proeza de Gregg To land é a imagem distorcida, fil mada a partir do chão, da en fermeira que entra no quarto de Kane logo depois que ele morre. Welles queria que a ce na fosse vista como "através de cacos de vidro".
Toland colocou na frente de sua lente grande-angular uma lente redutora que produzia efeito semelhante ao de um bi nóculo invertido.
O resultado, para Carringer, "é um precursor da lente gran de-angular 'olho de peixe', que se tornou comum na década de 60". Pena que, na edição brasi leira, as reproduções de ima gens como essas sejam de mui to má qualidade. (JGC)



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