São Paulo, terça-feira, 05 de dezembro de 2000

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Músico tinha um estilo explosivo

CARLOS BOZZO JUNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dizia o filósofo Aristóteles (384-322 a.C.) que, para ser hábil numa profissão, são necessários natureza, estudo e prática. O músico Baden Powell (1937-2000) reuniu as três, acrescentando a elas criatividade. Seu estilo explosivo e suas batidas de samba romperam com o som intimista de uma época, dando outra personalidade ao violão, registrada em mais de 50 discos -a maioria gravada em Paris- e em shows pelo mundo.
Powell nasceu em Varre-Sai, no interior do Rio de Janeiro. Em depoimento ao programa "Ensaio", de Fernando Faro -o produtor dos dois últimos discos do músico-, Powell relata que na cidade havia uma única rua, "que foi dividida em uma que desce e uma que sobe". Mal sabia o fluminense, que aos três meses mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, que, por meio da música, por muitas ruas ainda iria enveredar.
Powell esteve sempre alerta ao violão, desde a infância, quando conheceu o violonista do regional de Benedito Lacerda (1903-1958), Jaime Tomás Florence, o Meira (1909-1982), e dele virou pupilo.
Aos 13 anos, animava bailes de subúrbio e participava de rodas de samba com seus companheiros do morro da Mangueira. Ganhou prêmios como solista, trabalhou na Rádio Nacional, acompanhou vários artistas, tocou em boates e, em 56, compôs "Samba Triste", com Billy Blanco. Conheceu o poeta Vinicius de Moraes (1913-1980), de quem foi parceiro em uma extensa lista de sucessos.
Entre eles, "Canto de Ossanha", "Berimbau" e "Samba em Prelúdio", que Moraes, segundo Powell, julgava um plágio de Chopin (1810-1849), até concordar que não era, dizendo: "Se não é plágio, então ele esqueceu de fazê-la".
Em 63, mudou-se para Paris. Daí, tornou-se um dos maiores representantes da MPB no mundo, apresentando-se na Alemanha e nos Estados Unidos (67), em Portugal (68), no Japão (70), na Espanha (71), na França (75) e novamente no Japão, em 98.
Em 99, ele gravou no Sesc Vila Mariana, em São Paulo, o CD "Baden - João Pernambuco e o Sertão", hoje uma raridade. A tiragem de mil CDs foi vendida só nas unidades do Sesc e está esgotada, sem previsão de relançamento.
Em entrevista à Folha, João Zílio, 25, engenheiro de som, responsável pela gravação do CD e pela constante substituição das panelas com água quente que Powell usava para aquecer as mãos, comenta: "Ele deixou o violão em cima do piano e veio para a técnica escutar o que tinha gravado. Nessa, o instrumento caiu no chão, rachando a mão (parte do violão onde se localizam as tarrachas que afinam as cordas). Ele nem ligou. Pediu uma Super Bonder e um sargento (ferramenta de carpinteiro), esperou duas horas e gravou normalmente".
Simoninha, um dos produtores de "Lembranças", disse: "Este CD foi gravado depois do disco do Sesc. É o último trabalho que ele fez. Depois que a gente encerrou -isso foi numa quinta-, ele fez as fotos na sexta e, na segunda, me ligou, dizendo que estava mal. Na terça, foi internado e nunca mais saiu do hospital".


Texto Anterior: Música/lançamentos: Powell deixa violão divagar
Próximo Texto: Outros lançamentos: O fino biscoito do "rapcore"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.