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FERNANDO BONASSI
O país dos engenheiros
As escavações das estruturas deixarão marcas profundas
no faturamento
O PAÍS dos engenheiros apresenta suas armas: são anéis
de bacharéis e diplomas universitários emoldurados nas paredes de edifícios assinados. São projetos calculados com o pensamento
nos bolsos traseiros e plantas baixas
desenhadas por herdeiros em gabinetes que dariam dúzias de quitinetes de solteiro. São licitações casadas
por terceiros e aprovadas à toque de
caixa para o desenvolvimento imobiliário e do erário dos parceiros.
São guindastes eriçados pela beira
dos barrancos, escavadeiras excitadas aferradas às matas e britadeiras
cavalgadas por braços vigorosos em
obras faraônicas que embasbacam o
mundo inteiro!
Rios de sangue e de suor, de bombas e de dinheiro passam pelas estradas, usinas, plataformas, ferrovias e portos construídos por nossos
engenheiros. São as pirâmides desses imperadores brasileiros!
Engenheiros sonhadores, guerreiros pirados e ianques desbravadores
que se lançam sem pudores, plantando cabeças de ponte nos perigosos e minados desertos estrangeiros.
"Tudo pelo mercado", concordam
os fogosos investidores conservadores... E o supermercado é isso mesmo: usinas nucleares e experiências
espaciais que se afundam na trama
de acertos escusos em acordos internacionais; estradas monumentais abandonadas aos horrores das
selvas ou vicinais enfiadas em meio
às terras e pernas dos reprodutores
dos governadores da situação; aeroportos de alto padrão instalados nas
neblinas das serras expropriadas
dos coitados e avenidas modernas
para as aventuras suicidas da indústria automobilística multinacional,
subsidiada por bancos de desenvolvimento social.
Não se esqueçam os maconheiros
mais festivos: essa é a engenharia
fiscal do financiamento do Carnaval
do país dos engenheiros!
Não venham culpá-los pelos esquecimentos e erros demasiado humanos que todos cometemos ou
causamos ao enterrarmos o que não
gostamos ou queremos.
Nem se o desenvolvimento anda
assim meio travado, esquecido ou
mal pago. O meio ambiente é sempre o malvado, já que a inocência estética da natureza é a inimiga declarada da clareza e eficiência técnica
dos engenheiros.
O país dos engenheiros será sempre esse canteiro maneiro para os
sonhos de grandeza e deleite das
empresas e investidores empreiteiros.
Claro que certos engenheiros
agiotas podem retirar as escoras das
encostas do mercado financeiro a
qualquer momento, se não verem
acertadas e cobertas as suas cotas e
apostas no enriquecimento.
Mas, pelo menos, os operários pagos como escravos jamais darão trabalho como proprietários dessas cidades que constroem e são muito
bem treinados para ouvirem à distância a derrocada de seus empregos
quando a obra termina, desaba ou
afunda em falência, para o total desmoronamento de suas ilusões de
crescimento.
O país dos engenheiros esconde
tesouros enterrados em malas de dinheiro! Assim, um país de engenheiros pode, eventualmente, se tornar
um país de banqueiros, já que ambos
obram muito bem em seus balanços
de fim de ano. Por essas e outras, as
escavações das estruturas deixarão
marcas profundas no faturamento e
nas imediações das grandes realizações, exterminando os pobres distraídos que forem engolidos pelas
bocas dos lobos.
"Os lobos voam de helicóptero!",
foram as últimas palavras da vovozinha excitada, antes de confiar nas
coordenadas descontroladas desses
céus de brigadeiro e entregar-se à
volúpia do caçador aventureiro!
O terceiro setor da elite suicida
ainda poderá curar a ferida social de
todo o capital lavado em paraísos fiscais?
As estatísticas oficiais haverão de
redimir o país que um "Senhor Engenheiro" construir?
Ou a terra enraivecida continuará
mostrando as garras e os dentes,
mastigando as esquinas, para a alegria dos dentistas conveniados e desespero dos traficantes de meninas e
dos pastores de propinas?
A pressa e a preguiça são os pais litigiosos dessa família de imperfeição contagiosa?
EM TEMPO: as indenizações poderão ser calculadas tendo por base
o azar de quem passava por ali e a
sorte de quem lá longe se lembrou
de fazer seguro. Agora, seguro mesmo que morreu de velho só o dono
da companhia. Garantido nada é,
nem que a punição chegará aos culpados como chega aos inocentes.
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