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Crítica/DVD Série
"Oz" recorre à tragédia grega para repensar a América
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Décadas depois de a pequena Dorothy ter ido
parar no mundo encantado de Oz, o imaginário infantil do musical estrelado por
Judy Garland em 1939 cede lugar às cores sombrias de outro
espetáculo: a de homens transformados em bestas-feras e enjaulados na penitenciária de segurança máxima Oswald, cenário de "Oz".
A série, produzida pela HBO
de 1997 a 2003, acaba de ter os
oito episódios de sua primeira
temporada lançados em DVD
no Brasil.
É um modo de fazer justiça a
uma das mais inquietantes produções feita pela TV americana
e aqui programada de modo errático pelo SBT em dias mutantes e horários tardios.
Criada por Tom Fontana, autor de peças de teatro e professor de literatura antes de migrar para o universo da teledramaturgia, "Oz" é um dos pontos
altos da renovação estilística e
temática por que passam as séries, resultado de um processo
de mutação que teve início nos
anos 80 e se consolidou na década seguinte.
Como outros importantes títulos desse formato, "Oz" é um
espelho social, no qual seus
criadores representam o modo
como interpretam a América
contemporânea e seus dilemas
individuais e põem à prova, pela ficção, os efeitos nefastos de
sua política.
A prisão aqui é um microcosmo onde se refletem as divisões
e onde as relações de poder se
encaminham sempre da maneira mais brutal possível.
Violência
"Oz" não é para espectadores
sensíveis, pois nela predomina
um grau de violência que pode
incomodar quem busca a suavidade do entretenimento.
Mas sua ousadia não se esgota na representação de choque
que o tema propõe.
Entre outras sofisticações na
dramaturgia, Tom Fontana
reutiliza, da estrutura clássica
da tragédia grega, a figura do
corifeu, no personagem de Augustus Hill, que conduz o espectador ao universo do cárcere, apresenta seus personagens,
comenta as situações e pontua
seu relato com dados sociais sobre o sistema de prisões norte-americano.
Outra referência da tragédia
grega encontra-se na reflexão
política sobre a atualidade, retratada nos diversos grupos de
internos.
Gangstas negros, adeptos das
milícias que defendem a superioridade branca, mafiosos italianos, muçulmanos liderados
por uma versão de Malcolm X,
bandidos irlandeses, latinos
pés-de-chinelo e motoqueiros
tatuados são representantes de
tribos semelhantes às presentes em grandes metrópoles
norte-americanas.
Todos estão confinados em
Emerald City, uma versão da
sociedade de controle onde as
grades foram substituídos por
vidros.
Carregado de boas intenções,
o psicossociólogo Tim McManus (Terry Kinney) acredita
que a transparência dos espaços dê aos presos um simulacro
de circulação daqueles que vivem em liberdade.
Mas a série explora esse significado no sentido da alegoria:
cada personagem encarna uma
idéia precisa da condição humana e ocupa um lugar definido, está submetido a algum tipo
de sujeição ou a impõe a outros,
tal como qualquer um de nós.
OZ - 1ª TEMPORADA
Criador: Tom Fontana
Distribuidora: Paramount
Quanto: R$ 49,90, em média
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