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LIVRO/CRÍTICA
Relatório de Nicholas Saunders faz balanço contido dos anos 90
MARCELO RUBENS PAIVA
especial para a Folha
Nos anos 70, era o livro "LSD",
de John Cashman (Perspectiva),
que passava de mão em mão no
circuito universitário -nada mais
fascinante que ler em detalhes sobre o que se estava tomando.
Agora, chega ao Brasil "Ecstasy
e a Cultura Dance", um relatório
completo sobre "a droga do
amor".
Sem pretensões de fazer apologia
desta ou daquela droga, tais livros
embutem o retrato de uma época
-afinal, reflete na droga que se
toma o mundo em que se vive.
Exemplos: em momentos de recessão como no pós-guerra, assistiu-se ao boom da morfina; depois, a heroína invadiu uma Europa combalida pela crise econômica; em anos de crescimento que
exigiam produtividade sobre-humana, como os 80, a cocaína caiu
(ou foi jogada) do céu.
Nos prenúncios das inversões, o
LSD e o ecstasy anunciaram
(anunciam) que a insatisfação é
ampla e coletiva.
Tais livros devem ser lidos longe
das arcadas judiciais, mas através
da lupa comportamental.
"Ecstasy e a Cultura Dance",
cuja versão brasileira tem prefácio
da jornalista e colunista da Folha
Erika Palomino, musa da cultura
"dance" brasileira, traz um histórico da droga e de sua posterior
proibição, um balanço dos efeitos
pessoais e sociais e uma análise dos
danos físicos e psicológicos e das
experiências em rituais.
O autor foi cuidadoso em destacar o ambiente em que ela proliferou, o das "raves" (festas em
grandes espaços) e a cultura
"dance" gerada por usuários e
simpatizantes.
O LSD e o ecstasy não pertencem
a cultos de povos antigos. São drogas de laboratório.
Foram inventadas com intenções terapêuticas, na era de contestação à psicanálise -procuram-se sanar distúrbios psicológicos pela química e não de um longo tratamento em divã.
Ambas foram inventadas por
químicos (o ecstasy, na Universidade de Berkeley, Califórnia, berço da contracultura), testadas em
pacientes e depois banidas.
Quando banidas, entraram pela
porta dos fundos da invisibilidade
da cultura juvenil. Então, a mídia
representou o papel do diabo.
Uma das qualidades do livro é
mostrar as deturpações sobre a
droga, típicas em uma imprensa
sensacionalista. O autor prova que
jornalistas manipularam dados
para mistificar a droga.
Mas o autor usa argumentos
quase infantis para explicar a proibição, que seria um lobby da indústria do álcool e tabaco, e que os
jovens querem se divertir, "mas o
governo é contra".
Saunders, um usuário confesso,
por vezes parece um deslumbrado.
Afirma que, na Irlanda do Norte
em guerra, jovens católicos e protestantes se unem quando o assunto é ecstasy, e que "hooligans"
(torcedores de futebol) tornam-se
dóceis sob efeito da droga. Sugere
que o ecstasy traz a união de povos
e pacifica conflitos insolúveis.
"O MDMA (princípio ativo do
ecstasy) é único porque oferece
um rápido e eficiente desbloqueio
na estrutura de defesa da pessoa,
facilita a mudança de um estado
autodestrutivo para uma inclinação ao amor próprio e pelos outros, estimula as pessoas a trocar o
isolamento pelo contato e intimidade pelos outros", está no livro.
Dentro de um ambiente em que
as relações pessoais são tensas e regradas (travadas), como entre a
juventude inglesa e norte-americana, o ecstasy torna-se a salvação.
Já em países latinos como França,
Espanha e Brasil, onde a afetividade extrapola esferas da razão, a
droga é pouco usada.
Livro: Ecstasy e a Cultura Dance
Autor: Nicholas Saunders
Lançamento: Editora Publisher Brasil
Quanto: R$ 25 (300 págs.)
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