São Paulo, Sábado, 06 de Março de 1999
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Festival de cinema fantástico acaba hoje em Portugal

BERNARDO CARVALHO
enviado especial ao Porto

Os portugueses não têm medo de nada. Quando um homem é cortado em cubinhos numa das primeiras cenas de "Cube", filme do canadense Vincenzo Natali em competição no 19º Fantasporto, a platéia cai na gargalhada.
O Festival Internacional de Cinema do Porto (originalmente Festival do Cinema Fantástico) termina hoje. O diretor, Mário Dorminsky, faz de tudo para que o fantástico não seja entendido como sinônimo de filme de horror: "Para nós, ele vai de Meliès a "Providence", de Alain Resnais, passando por Jean Cocteau, os expressionistas alemães e Roger Corman".
Mas a platéia que vai assistir a filmes como "Cube", uma ficção científica mais para Moebius (desenhista cult de quadrinhos) do que para Andrei Tarkovski, quer ver sangue e morrer de rir.
Embora restrito, existe um público cativo para o culto do trash. O brasileiro Ivan Cardoso, que este ano está no festival com o curta inédito "Hi-Fi", homenagem a Augusto de Campos, levou o Prêmio do Público, em 87, com o seu "As Sete Vampiras", representante do estilo definido pelo próprio cineasta como "terrir".
Dorminsky sabe que para fazer uma mostra competitiva de cinema fantástico todo ano precisa se contentar com o que existe -e que nem sempre é o que gostaria de exibir. Aos poucos o Fantasporto foi diversificando seu formato e hoje, além da seleção oficial de cinema fantástico, promove duas outras competições (Semana dos Realizadores e Fantásia -com filmes asiáticos), além de retrospectivas -este ano, uma delas é dedicada a Júlio Bressane.
O filme que abriu o Fantasporto 99, por exemplo, foi "Bullworth", de Warren Beatty, antípoda por excelência do cinema trash, que é o deboche do comercial, uma produção cinéfila de baixíssimo orçamento.
Para alcançar um público maior, o Festival do Porto decidiu caminhar nesse limite improvável, e por vezes contraditório, entre o trash e o comercial. Entre uma coisa e outra, há filmes com uma certa atmosfera onírica, como "Animals", de Michael Di Jiacomo, que, embora chamado de "independente", está bem mais próximo do comercial.
"A cada três dias aparece um novo festival de cinema no mundo", diz o finlandês Mika Seppl, organizador do festival de cinema de Helsinque, cujo tema é "Amor e Anarquia". É difícil para um festival como o do Porto manter uma identidade própria, atrair um público cada vez mais cativo do cinema comercial americano e sobreviver paralelamente aos grandes festivais que exigem ineditismo e exclusividade dos filmes exibidos.
Muitos filmes do Fantasporto já foram exibidos em circuito comercial ou festivais em outros países, o que dá à mostra uma importância de divulgação sobretudo local. Isso não quer dizer que não haja filmes interessantes ou inéditos.
O jornal "Público" celebrou "Quando Troveja", longa-metragem de estréia de Manuel Mozos, como uma das maiores revelações do cinema português dos últimos dez anos. O filme, que está na competição da Semana dos Realizadores, é uma espécie de conto de fadas com personagens aleijados, duendes e até uma fada com uma prótese como perna.
Entre os típicos representantes do "horror trash" na competição, destacam-se os americanos Richard Elfman, com o filme de vampiros "Revenant", e Brian Yuzna, com "Progeny".
O dinamarquês Lars von Trier faz sua passagem pelo gênero com "The Kingdom 2", continuação da série sobre hospitais que fez para a televisão. Uma espécie de "Plantão Médico" com espíritos do mal.
Os prêmios do Fantasporto 99 serão anunciados no sábado. É difícil imaginar o que pode passar pela cabeça do júri diante desses filmes. Os critérios devem ser, no mínimo, divertidos.


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