São Paulo, terça-feira, 06 de abril de 2004

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PRÊMIO CHAMEX

Exposição recicla hábitos do público

JULIANA MONACHESI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Uma reciclagem de sensibilidade estética. É disso que trata a intervenção urbana de Vera Uberti apresentada em registro videográfico na exposição do 1º Prêmio Chamex de Arte Jovem, em cartaz no Instituto Tomie Ohtake e que dá o tom das pesquisas artísticas ali exibidas.
Em um posto de coleta seletiva de lixo em um supermercado de São Paulo, a artista negociou a substituição das tradicionais sinalizações "vidro", "plástico", "papel" e "alumínio" nos contêineres, oito ao todo, por palavras que designam os sete pecados capitais (que ela torce ligeiramente para transformar em oito). O vídeo é algo ingênuo ao repetir closes do slogan da campanha de reciclagem do local: "Doe seu lixo aqui". Redunda. De resto, é impecável. Uma pequena subversão no cotidiano que afeta os usuários do posto, assim como a nós, espectadores condicionados.
Em um contexto de esgotamento do modelo dos salões e de oxigenação dos formatos de incentivo e subsídio às artes, com sopros que vêm de Belo Horizonte (bolsa Pampulha) e de duas ou três instituições em São Paulo com programas sistemáticos de fomento à produção emergente, surge esse prêmio voltado a universitários, que oferece bolsas de estudo (no exterior e em SP) e a oportunidade de expor no circuito institucional pesquisas em gestação.
O espaço destinado à exibição das obras dos 26 selecionados por Agnaldo Farias, Eduardo Brandão, Flavia Ribeiro, Lorenzo Mammì e Stela Barbieri é pequeno em face da ambição do projeto. O trabalho que recebeu o primeiro prêmio, "Jardim Interno", de Chiara Banfi, resultou tímido; quatro dos cinco vídeos selecionados (dois deles premiados) ficaram segregados em uma sala, o que enfraquece a principal qualidade da mostra: a diversidade.
Apesar de limitado em sua vocação expansiva, "Jardim Interno" é instigante. Feito a partir de prosaicas folhas de contact coloridas, a instalação se espraia em um desenho orgânico que inverte a lógica do jardim, tornado plano e como que pendurado no teto. À padronagem obtida com papel contact, Chiara soma fragmentos de fotografias de natureza: traz o jardim para o interior arquitetônico (e subjetivo, de quem observa detalhes quase invisíveis).
Esta, a faceta poética do trabalho. Seu lado cáustico emerge à medida que tangencia o decorativo: o jardim domesticado e asséptico, feito sob medida para a casa-clausura contemporânea. O caráter político perpassa a mostra: está em "Habitação Imaterial", de Bruno Faria, que registra clandestinamente as ficções imobiliárias que são os "apartamentos decorados"; na sufocante performance de Amanda Melo (exibida em vídeo e que será realizada em São Paulo no dia da premiação), em que a artista reveste seu corpo de fita isolante e anda pelas ruas.
A foto e o vídeo predominam, o que é sintomático. A obra mais ousada, as manipulações digitais de Clayton Camargo Jr., assumidamente anti-representacional, é a que mais se destaca em termos experimentais, mas não foi premiada. O júri, de inegável competência, optou na premiação por trabalhos mais convencionais.


1º Prêmio Chamex de Arte Jovem
   
Onde: Instituto Tomie Ohtake (av. Faria Lima, 201, SP, tel. 0/xx/11/6844-1900)
Quando: de ter. a dom., das 11h às 20h; até 2/5; premiação no dia 15/4, às 19h30
Quanto: entrada franca



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