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CRÍTICA
Versão não alcança a graça da peça
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Em "O Mistério de Irma Vap",
peça do ator e dramaturgo
norte-americano Charles Ludlam
(1943-1987) que se manteve em
cartaz no Brasil durante 11 anos,
Marco Nanini e Ney Latorraca
trocavam de figurino em segundos, muitas vezes, para encarnar
diversos personagens. A montagem dirigida por Marília Pêra não
se resumia a isso, mas nocauteava
o público graças sobretudo ao ritmo inebriante com que os atores
conduziam a extravagância.
"Irma Vap - O Retorno" procura evitar a alternativa fácil da mera
transposição do espetáculo para o
cinema. Fácil e perigosa: o que
sustentava a comunicação -reaquecida toda noite- entre palco
e platéia tenderia naturalmente a
desaparecer em um filme. Como
encontrar o equivalente, por
exemplo, à graça provocada pelo
frenético entra-e-sai dos atores e
pelos "cacos" do texto?
Optou-se, assim, por contar
uma história que fala sobre a peça.
Não a de Marília, Nanini e Latorraca, mas a que um dia foi estrelada pelos fictícios Tony Albuquerque e Darcy Lopes. A morte de
um de seus produtores desencadeia, em seu filho e no sócio remanescente, a idéia de remontá-la
com novo elenco, em busca de lucros que paguem as dívidas acumuladas desde que se foram os
anos felizes de "Irma Vap".
O primeiro "retorno" de que fala o título é, portanto, o do texto
de Ludlam em um contexto de
ficção. Quem retorna também, no
entanto, é a dupla Nanini-Latorraca das centenas de apresentações de "Irma Vap". Cada um responde por dois personagens, e em
mais dois extraídos da peça, reeditando a montagem anterior.
Percorre-se outro caminho para
chegar ao mesmo destino. Paga-se, por conseqüência, a mesma tarifa da qual se tentou escapar: ainda que Nanini e Latorraca pareçam se divertir com o reencontro
e sejam também capazes de divertir o público, o filme se organiza
em torno dos efeitos cômicos de
homens interpretando mulheres
e de atores encarnando um punhado de personagens distintos.
O cinema entra na celebração
com matéria-prima para a paródia. Se a peça olhava com zombaria para "Rebecca, a Mulher Inesquecível" (1940), de Alfred Hitchcock, sobre uma jovem (Joan
Fontaine) que vive à sombra da
ex-mulher do marido (Laurence
Olivier), "Irma Vap - O Retorno"
mira em "O que Terá Acontecido
com Baby Jane?" (1962), de Robert Aldrich, sobre duas irmãs
(Bette Davis e Joan Crawford) que
vivem em uma mansão de Hollywood. Não é o bastante para dar
ao filme autonomia em relação ao
método -não ao tema- da peça
de Ludlam e de sua bem-sucedida
montagem brasileira.
Irma Vap - O Retorno
Direção: Carla Camurati
Produção: Brasil, 2006
Com: Marco Nanini, Ney Latorraca
Quando: a partir de amanhã no Espaço
Unibanco e circuito
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