São Paulo, sexta-feira, 06 de abril de 2007

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THIAGO NEY

Bert

Engenheiro elétrico, passou 20 anos sem falar com o filho; ao morrer, seu último gesto foi uma piscada de olho

BERT NÃO foi um herói. Nunca quis ser um, nada tentou fazer para sê-lo. Em sua vida comum, ordinária, não protagonizou episódios que estimulassem uma biografia apimentada. Pelo menos não diretamente.
Engenheiro elétrico, Bert passou a vida trabalhando no mesmo galpão de fábrica, até se aposentar.
Veterano de guerra, casou-se com Doris em 1936. Para livrar a mulher de um serviço obrigatório para o governo britânico, o casal teve um filho. Era 1943. No ano seguinte, em plena Segunda Guerra Mundial, um foguete alemão destruiu a casa da família, e eles tiveram de mudar para um subúrbio londrino.
Reservado, calado, Bert, não compartilhava da paixão do filho pela música. Quando o menino encanava de tocar guitarra em casa, costumava resmungar: "Pare com esse barulho". Mas o menino não parava. E Bert o deixava continuar, até voltar para casa na noite seguinte, encontrar o filho com a guitarra e resmungar novamente.
Um dos passatempos de verão de Bert era levar o filho para jogar tênis, num clube perto de onde moravam.
No início dos anos 60, separou-se da mulher e, em seguida, viu o filho sair de casa. Ficou mais de 20 anos sem falar com o garoto. Os dois se reencontraram em 1982. E o filho ainda não tinha largado a guitarra.
Após todos os anos que passaram distantes, pai e filho se aproximaram novamente. Por causa de seu trabalho, o filho passava muito tempo fora de casa. A partir de 1989, Bert começou a acompanhá-lo em todas as viagens mais longas. Não importava em qual parte do mundo o filho se metesse -Bert estaria lá.
Em agosto de 2000, a saúde de Bert ficou bastante debilitada em decorrência de problemas no coração. Na cama do hospital, seu último gesto foi uma terna piscada de olho em direção ao filho. Bert morreu. Cremado, suas cinzas foram cheiradas pelo filho.

 

A empresária de Keith Richards desmentiu o episódio. Disse que Keith Richards estava "brincando" quando contou a história durante uma entrevista. Pode até ser. Não importa. Alguém duvida que o guitarrista dos Stones seria capaz de cheirar as cinzas do pai?
 

Dá para gastar muita tinta com Keith Richards. Os riffs perfeitos de "Satisfaction", "Start Me Up"...; composições como "Street Fighting Man", "You Can't Always Get What You Want"...; a lenda de que ele teria trocado todo o sangue numa clínica da Suíça, para se desintoxicar de drogas pesadas; o fato de ter inspirado um livro com o sugestivo título "I Was Keith Richards" Drug Dealer" (Eu fui traficante de Keith Richards), de Tony Sanchez.
E, é claro, deve-se respeitar um milionário de 62 anos que passa por uma cirurgia na cabeça porque se arrebentou no chão ao tentar escalar um coqueiro nas Ilhas Fiji.
 

Keith Richards é um gênio do rock.

thiago@folhasp.com.br

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