São Paulo, segunda-feira, 06 de maio de 2002

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FESTIVAL

Subsídio do governo australiano a mostras impõe obras dos autóctones, que "o público não entende", diz gerente

Arte dos aborígenes é presença forçada

DO ENVIADO À AUSTRÁLIA

Os brasileiros estão prestes a fazer o primeiro contato com representantes de tribos de uma civilização milenar que habitava a Austrália muito antes de o país ser descoberto pelo explorador inglês James Cook, em 1770.
Hoje, o governo australiano estima que vivam no país cerca de 352 mil descendentes de aborígenes (a Austrália tem 19,4 milhões de habitantes). A cultura e a arte desse povo, dizimado pela colonização européia, passou a ser prioridade governamental há pouco.
Em 95, foi criada uma política específica de preservação cultural, com facilidades de financiamento a projetos que tentem traduzir para os descendentes de europeus algo dos costumes dos nativos.
O 6º Cultura Inglesa Festival trará três atrações que se beneficiaram dessa política: a exposição "Season of Kunwinjku", o espetáculo multimídia "Crying Baby" e o musical "Alice", da descendente de aborígenes Alice Haines.
"Crying Baby" é o que melhor sintetiza o tema abordado pela maioria dos espetáculos feitos por grupos indígenas: os problemas que o homem branco introduziu na vida dos aborígenes.
A Folha assistiu a três atrações do último Adelaide Festival, no início de março deste ano: as peças "Love Land and Money" e "The Career Highlights of the Mamu" e a coreografia "Skin", do Bangarra Dance Theatre.
Nos três, o europeu (ou o australiano) é mostrado como o mal ("Mamu", por exemplo, significa Diabo). Terras que foram tiradas de nativos, problemas de compreensão cultural e novidades importadas pelo mundo dito civilizado (como a introdução do álcool a um povo despreparado e o vício de inalar petróleo) conduziam os espetáculos.
Uma das principais dificuldades, segundo Rick Shapter, do Australia Council for the Arts, órgão destinado às artes e ligado ao governo, é despertar o interesse dos australianos descendentes de europeus para esses assuntos.
Como praticamente todos os festivais de arte do país são, em parte ou totalmente, patrocinados pelo governo, há uma cobrança para que neles sejam incluídas atrações da cultura aborígene. É o que explica Mary-Ellen King, gerente-geral do Melbourne Festival, um dos mais importantes da Austrália.
"Quando o governo libera o patrocínio do festival, espera que, entre as atrações, esteja algo da cultura aborígene. O público não entende os temas levantados pelo espetáculo, a procura é pequena e quem assiste à peça parece prestigiar apenas porque sente pena", afirma King.
(LEANDRO FORTINO)


O jornalista Leandro Fortino viajou a convite do Departamento de Relações Exteriores e Comércio da Austrália



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