São Paulo, terça-feira, 06 de junho de 2000


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ARTES PLÁSTICAS
Lençol sujo de urina, fotos de baratas eletrocutadas e boneca de fezes são trabalhos expostos em Londres
Obras bizarras confundem truque e arte

France Presse
Escultura do italiano Maurizio cattelan representa o papa João Paulo 2º caído no chão, abatido por um meteoro, que fará parte da exposição "Apocalypse"



RICARDO GRINBAUM
DE LONDRES

Um passeio pelas galerias de arte londrinas nesta temporada promete revirar os estômagos mais sensíveis. Tracey Emin, uma estrela entre os novos artistas britânicos, mostra um lençol sujo com urina. A norte-americana Catherine Chalmes expõe fotos de baratas eletrocutadas. Outro norte-americano, Mike Kelley, apresenta bonecas feitas com excremento. Já o italiano Maurizio Cattelan exibe o papa João Paulo 2º caído no chão, abatido por um meteoro.
Abra o jornal qualquer dia da semana em Londres e você terá uma surpresa. Sempre surge uma nova exposição que vai chocar, revoltar ou enojar o público. Não é difícil entender uma das razões para tanto barulho. Numa cidade que concentra 85 dos melhores museus e galerias do mundo e oferece 150 exposições ao mesmo tempo, os artistas tentam de tudo para se sobressair.
O vale-tudo ficou ainda mais acirrado depois da recente inauguração da Tate Modern, o maior museu de arte moderna e contemporânea do mundo. Apelidada pelos jornais britânicos como a "catedral do cool", a nova Tate deve receber 3 milhões de visitantes por ano, atraídos pelas pinturas, esculturas e instalações mais ousadas entre os grandes museus de fama internacional.
"Há um enorme interesse no Reino Unido pela arte contemporânea", disse à Folha Mathew Collings, um dos críticos mais populares do país, apresentador de séries na televisão e autor de livros sobre arte. "As pessoas querem algo na vida além das novelas de televisão e estão eletrificadas pelas novidades no campo das artes."
O problema, diz Collings, é que as pessoas têm o mesmo interesse por tudo que ganha espaço nos meios de comunicação, sejam fofocas sobre a vida de artistas sejam polêmicas sobre obras de arte. "Nessa confusão, ficou difícil separar o que é arte do que é um truque para aparecer. O que vale é provocar escândalo, mesmo se não tiver o menor fundamento filosófico", diz o crítico.
Até os artistas mais talentosos do Reino Unido estão sendo questionados sobre a qualidade de seu trabalho. Damien Hirst, expoente máximo da geração de jovens artistas britânicos, está na galeria Saatchi com um gigantesco tronco humano, aberto, expondo os órgãos internos.
O trabalho não é criticado apenas por seu objetivo, mas também por sua originalidade. Trata-se de uma réplica exata de um brinquedo usado para ensinar anatomia para crianças. Hirst foi processado pelo fabricante e, como eram grandes as chances de perder na Justiça, decidiu fazer um acordo e indenizar a empresa.
É claro que, ao lado de trabalhos apelativos, os britânicos continuam produzindo algumas das obras de arte de melhor qualidade e mais inovadoras do mundo. O problema é que também está cada vez mais difícil sobressair - e se diferenciar- em meio a tantas armas de marketing usadas pela concorrência.
O melhor retrato do que está acontecendo na corrida pela atenção dos jornais surgiu há dez dias, quando o comerciante de obras de arte Larry Gagosian abriu uma nova galeria. Para a inauguração, providenciou uma cena de efeito: 23 mulheres ruivas ficaram nuas e impassíveis durante três horas, num salão imaculadamente branco. A explicação para a performance: "Sexo vende", diz o curador da galeria, Rowen Smith.


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