São Paulo, segunda-feira, 06 de junho de 2005

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POLÍTICA CULTURAL

Na disputa por verbas estatais, cineastas do Nordeste reagem à "articulação" do Sudeste com o ministro José Dirceu

"Cineminha" declara guerra ao "cinemão"

Rodrigo Petterson
O cineasta cearense Wolney Oliveira, que reúne assinaturas para documento que enviará a Brasília


SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A FORTALEZA

"Isolados, não temos o mesmo poder de fogo deles. Mas, se formos todos juntos, é bala contra bala." Quem mede as forças em jogo e delineia a batalha que se avizinha é o cineasta cearense Wolney Oliveira ("Milagre em Juazeiro").
O diretor está reunindo assinaturas de profissionais do Norte e do Nordeste para um documento que será encaminhado na próxima semana aos ministros José Dirceu (Casa Civil), Antonio Palocci Filho (Fazenda) e Gilberto Gil (Cultura).
"É uma resposta a esta articulação de bastidores do "cinemão'", diz Oliveira. Ele se refere à reunião que Dirceu teve no Rio, neste mês, com o produtor Luiz Carlos Barreto, os cineastas Roberto Farias ("Pra Frente, Brasil"), Paulo Thiago ("O Vestido"), André Sturm ("Sonhos Tropicais") e o exibidor Luiz Severiano Ribeiro.
O grupo pediu o encontro para dizer ao chefe da Casa Civil que a "pulverização" de recursos destinados ao cinema pelas empresas estatais prejudica a atividade.
No fim deste mês, a Petrobras, maior patrocinadora de filmes nacionais, divulgará a lista dos projetos aos quais destinará R$ 19,6 milhões em patrocínio.
"Eles querem que a torneira seja aberta só no copinho deles. E estão revoltados porque não têm mais o controle das estatais", afirma Oliveira. O diretor cearense não tem projetos na disputa. "Mas quero ter no ano que vem", completa.
"Nos oito anos FHC [1995-2002], o BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] financiou 172 longas. Apenas dois eram do Norte-Nordeste", afirma Oliveira.
O cearense considera esses dados um exemplo de que "no governo Fernando Henrique Cardoso, o "cinemão" controlou [a distribuição de verbas de patrocínio pelas empresas] estatais".
"É uma tolice esta tentativa de algumas pessoas que se autointitulam representantes do "cineminha" de criar uma dicotomia entre o "cineminha" e o "cinemão", a partir da iniciativa que tivemos de procurar o ministro José Dirceu", rebate Sturm.
O cineasta participou do encontro com o ministro como presidente do Sicesp (Sindicato da Indústria Cinematográfica do Estado de São Paulo) e membro da Abradi (Associação Brasileira das Distribuidoras Independentes).

Reivindicação
O que se pediu a Dirceu, segundo Sturm, não é a concentração de recursos no eixo Rio-SP, mas que haja distribuição de um volume maior de dinheiro a um número menor de filmes, para garantir que todos se realizem nas condições previstas em seus orçamentos.
"Quando a Petrobras coloca R$ 500 mil em 40 filmes, em vez de ter 40 filmes, ela arranja 30 problemas", diz o cineasta paulista. O "problema" a que ele se refere é o de projetos que obtêm apenas parte de seu orçamento estimado.
Nestes casos, ou o Estado irá "empatar" dinheiro num filme que jamais será concluído, ou o diretor fará um filme "menos bom" do que planejou -é a tese de Sturm, para quem a questão em debate não é a defesa do "cinemão", mas sim da indústria do cinema, "uma atividade de escala, cara e complexa".
O edital da Petrobras não estabelece quantos filmes deverão ser premiados no concurso. Dirceu considerou "relevantes" as "preocupações" do grupo, segundo o relato de Sturm.
O chefe da Casa Civil teria dito que, como observador distante da atividade cinematográfica, "de certa maneira, percebe que há problemas" em sua gestão.
A carta do "cineminha" endereçada aos ministros terá um tom de apoio à gestão do ministro Gilberto Gil e à sua equipe no ministério -predominantemente de profissionais nordestinos.
Na semana passada, durante sabatina na Folha, Gil afirmou que "muita gente quer" que ele deixe o governo, descartando os rumores que lhe atribuem a intenção de entregar o cargo.
A jornalista Silvana Arantes viajou a convite da organização do 15º Cine Ceará.

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