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Temporada de festivais coloca em evidência a cultura eletrônica que vai além das pistas
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
O start já foi pressionado. Com
o Eletronika, que começou ontem
e vai até domingo em Belo Horizonte, o Hype, que inicia na próxima quinta-feira em SP, a edição
paulista do Sónar Sound, marcada para setembro, além de Tim
Festival, Resfest e F.I.L.E., em novembro, tem início uma extensa
temporada de festivais em que
não só a música mas a cultura eletrônica ocupa o centro do debate.
Debate? Pois bem, para além da
pista de dança -que também
passa muito bem, obrigado-, todos esses eventos pretendem levantar questões sobre direitos autorais, sampling, autoria coletiva,
novos formatos de distribuição,
as relações entre a música e as artes visuais e, por que não, o papel
político e social da eletrônica. A
"cena" amadureceu.
"Já provamos que a música eletrônica é grande no Brasil, está na
mídia, e os festivais atraem milhares de pessoas. É hora de usar isso
como forma de expressão", afirma o DJ e jornalista Camilo Rocha, membro-fundador da associação Amigos da Música Eletrônica. Rocha é presença certa no
debate Engajamento Eletrônico,
que acontece hoje, às 17h, como
parte do festival mineiro.
Paralelamente à sua função social, bandeira levantada há anos
pelo hip hop, outra antiga discussão dos DJs, cuja matéria-prima
não raro são as gravações feitas
por outros artistas, voltou com
força aos holofotes com a revolução digital. O que é de quem.
"A grande questão da música
eletrônica hoje são os direitos autorais. Está mais fácil, barato e
acessível produzir boas músicas
com softwares gratuitos ou até piratas, na pior das hipóteses", afirma Jefferson Santos, um dos organizadores do Eletronika.
"O direito de autor é o mesmo
para qualquer gênero musical, seja ele o eletrônico, o sertanejo, o
axé ou a música clássica. O que
deve ser pensado é que há um novo comportamento, tornado possível pelos adventos tecnológicos
popularizados na última década,
que ainda não foi absorvido pelo
direito nem pela indústria fonográfica", esclarece Caio Mariano,
advogado e autor da licença
L.U.C.R., aplicada pelos pernambucanos do Re:Combo e Mombojó, que abre a possibilidade de outros retrabalharem suas faixas.
Politização, engajamento e direitos na música eletrônica. Passando a régua, resta o nó da distribuição, ou democratização, para
usar o vocabulário mais militante.
E, aí, não se fala em outra coisa
atualmente que não "distribuição
por celular" -não é à toa que
operadoras de telefonia móvel e
fabricantes de aparelhos estejam
disputando o território a tapas.
O Sónar Sound São Paulo, que
acontece entre 8 e 12 de setembro,
terá uma mesa de debate específica sobre o tema, com nomes que
vão desde o artista multimídia
Golan Levin, "maestro" de um
dos primeiros concertos de celular de que se tem notícia, até o VJ e
mediador do debate, Spetto.
Aqui e em outras tantas subcamadas desses festivais, música e
artes plásticas, pop e erudito, ruído e melodia se encontram, sob o
filtro das novas tecnologias.
"Se o analógico já era interessante, no mundo digital, as possibilidades se multiplicam por mil",
opina Ricardo Barreto, organizador do Festival Internacional de
Linguagens Eletrônicas - F.I.L.E.,
que será realizado no final de novembro em São Paulo.
Numa variação mais radical sobre o mesmo tema -"a música
eletrônica está em decadência; o
que interessa é o que vai além"-,
Barreto comenta que essa edição
do festival multimídia dificilmente conseguiria ser enquadrada sob
um só rótulo. "Estamos entrando
num momento de transdisciplinaridade. E tanto a música como
as artes plásticas recebem todo esse impacto, até deixarem de ser só
música, até deixarem de ser só artes plásticas."
Marcos Boffa, curador do Eletronika e do Sónar, pondera:
"Não existe uma única direção na
música eletrônica. Uns vão para o
lado da arte contemporânea, pensando a música como forma de
intervenção estética sobre o mundo, mas outros continuam com a
cabeça voltada só para a pista".
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