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CINEMA/ESTRÉIAS
"DUAS VIDAS"
Disney cria fábula de regressão conservadora
TIAGO MATA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
O nome do compositor John
Williams não consta na ficha
técnica de "Duas Vidas", mas, logo que o filme começa, são os
acordes da música-tema de "E.T.
-0O Extraterrestre" que reconhecemos na trilha sonora assinada
por Marc Shaiman.
Eles estão lá para nos lembrar de
que, de uma forma ou de outra,
Steven Spielberg não pode deixar
de ser responsabilizado por mais
este subproduto da Disney.
Afinal, desde que Spielberg começou a fazer fortuna em filmes
de regressão explícita, o infantilismo nunca mais deixou de ser um
dos filões prediletos da indústria
cinematográfica norte-americana. Spielberg descobrira, sobretudo, uma demanda da classe média, e a Disney, a produtora mais
"família" da América, não demoraria a se dar conta disso. Nesse
sentido -e apenas-, "Duas Vidas" é exemplar.
A Disney, pelo menos, nunca
deixa de ir direto ao assunto: já
que se trata de regressão, façamos
um filme em que um homem
trombe um dia, em sua casa, com
a criança enjeitada que foi outrora. Ou melhor, contemos a história de um "consultor de imagens"
(Bruce Willis), sujeito ocupado e
intolerante, que se depara, certa
feita, com a imagem que mais
procurou negar na vida: a do garoto gorducho e desastrado que
foi na infância.
Os autores do projeto não tiveram, provavelmente, muita dificuldade para vender o seu peixe.
"Eis uma idéia inédita, universal",
alegam no material de divulgação.
"Ninguém cresce e se torna aquilo
que imaginou." Afinal, "que
criança ficaria feliz com o adulto
no qual se transformou?". Bem,
em se tratando do padrão Disney
de produção, será preciso, é claro,
fazer com que essa criança reivindique os bons e velhos valores familiares. É assim que o garoto
pressionará o adulto a se casar, ter
filhos e cachorros. Tanto melhor,
portanto, se, ao lado do azedo
executivo, trabalhar uma moça de
bom coração, prontinha para o
casório.
"Duas Vidas" afigura-se, então,
um processo de auto-análise. A
criança ajuda o adulto a se curar
dos traumas de infância (Oh! Que
traumas!) na medida em que o
adulto ajuda a criança a encarar
os seus próprios problemas. Inevitável dizer que, ao final de toda
essa terapia, o personagem de Willis terá se tornado muito menos
interessante. No começo, antes de
se ver preso no "universo paralelo" spielberguiano, o personagem
tinha, ao menos, um certo espírito, pois, na qualidade de "personal stylist", não se furtava ao direito de dizer aos seus clientes o
que realmente achava deles.
Duas Vidas
The Kid
Direção: Jon Turteltaub
Produção: EUA, 2000
Com: Bruce Willis, Spencer Breslin e
Emily Mortimer
Quando: a partir de hoje nos cines
Center Norte, Interlar Aricanduva,
Paulista, SP Market e circuito
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