São Paulo, sábado, 06 de novembro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES

Catálogo do IEB mostra o interesse do escritor pelo folclóre por meio de 236 itens recolhidos em diferentes pontos do país

Mário de Andrade busca o Brasil em objetos

LUCIANA ARAUJO
DA REDAÇÃO

A busca de Mário de Andrade pelas características brasileiras foi incessante. As pistas encontradas não se perderam. Escritor, registrou muitas delas na literatura. Colecionador compulsivo, guardou outras tantas, que hoje estão no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB), da USP, que desde 1968 detém o Acervo Mário de Andrade -declarado patrimônio nacional pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em 1995.
A tentativa de decifrar tais pistas (livros, cartas, ensaios, fotos, objetos, obras de arte), mantendo a linha de pensamento/pesquisa do escritor, tem resultado em publicações recentes, caso de "A Música Popular Brasileira na Vitrola de Mário de Andrade" e do catálogo realizado a partir do acervo de objetos, "Coleção Mário de Andrade - Religião e Magia/ Música e Dança/ Cotidiano", organizado pela arquiteta e pesquisadora Marta Rossetti Batista, lançado hoje, às 11h, no IEB.
O catálogo reúne 236 objetos como imagens católicas e de cultos afro-brasileiros, instrumentos musicais e indumentária indígena, colhidos entre 1919 e 1945, que foram analisados um a um e reproduzidos em fotografias.
Diferentemente do catálogo, "Coleção Mário de Andrade - Artes Plásticas" (1985), sobre as obras de arte pertencentes ao escritor, esse outro foi elaborado a partir do cruzamento de pistas e hipóteses. "Era muito mais fácil saber o que Mário achava das obras. Crítico de arte, ele escreveu sobre elas", explica Batista. "Já o segundo abarca objetos sobre os quais não há anotações e que são muito variados. Colhidos em lugares diferentes e de várias maneiras. Como todos sabiam que Mário colecionava estes objetos, era comum ele receber peças achadas por amigos por todo o país", destaca a pesquisadora.
Ao enviar o arquiteto Luiz Saia ao Nordeste como chefe da Missão de Pesquisas Folclóricas, em 1938, Mário de Andrade, então diretor do Departamento de Cultura de São Paulo, teria feito também sua encomenda particular. "Pediu para que Saia trouxesse imagens de santos", diz a pesquisadora.
Na viagem, além dos tradicionais ex-votos em forma de pequenos quadros, Saia teria encontrado ex-votos feitos de madeira. "Minha hipótese era de que Saia queria dividir com o amigo a descoberta dessa nova forma de arte, que parecia autenticamente brasileira". Hipótese retirada de comentário encontrado em carta de Saia a Mário: "o santo é a cara do caboclo nordestino".
Uma das fontes dos objetos afro-brasileiros da coleção teria sido a polícia. "Durante o governo Vargas, os policiais fechavam terreiros e apreendiam as peças. Muitos só foram parar nas mãos de Mário porque um delegado ouviu falar da missão e enviou os objetos ao escritor", conta Marta.
Com relação aos objetos indígenas, Marta trabalha com duas hipóteses: "elas seriam uma mostra concreta das pesquisas do alemão Koch-Grünberg, das quais Mário colhe o mito para elaboração de "Macunaíma" ou reminiscências do mundo desse personagem".


Texto Anterior: Rodapé: Bastidores da invenção
Próximo Texto: Catálogo revela origem musical em "Macunaíma"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.