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MEMÓRIA ROCK AND ROLL
Stones mataram o sonho hippie há 30 anos
THALES DE MENEZES
da Reportagem Local
Meredith Hunter, filho de família pobre e negra da Califórnia, tinha 18 anos em 1969. Como tantos outros jovens da época, havia
largado a escola e a casa dos pais.
Vivia pelas ruas, dormia em comunidades hippies e, às vezes, tinha problemas com o temperamento brigão. Hunter mudou os
caminhos do pop. Ele foi assassinado a poucos metros de Mick
Jagger, dos Rolling Stones.
A morte do garoto foi apenas o
mais grave dos muitos incidentes
que marcaram a desorganizada
apresentação dos Stones no autódromo de Altamont, em Livermere, Califórnia, no dia 6 de dezembro de 1969. O concerto foi um
balde de água fria na efervescência hippie detonada poucos meses
antes pelo festival de Woodstock,
que reuniu 400 mil jovens dedicados a fazer amor livre, alcançar estados alterados da percepção e,
quem sabe, até ouvir música.
Os Stones também tiveram, antes de Altamont, seu momento de
paz e amor. Sozinhos, no dia 5 de
julho de 1969, levaram 250 mil fãs
ao Hyde Park, em Londres, no
concerto que marcou a estréia do
guitarrista Mick Taylor na banda.
Ele estava substituindo Brian Jones, membro fundador dos Stones afastado do grupo por não
conseguir segurar a onda das drogas. Dois dias antes do concerto
no Hyde Park, Jones foi encontrado morto na piscina de sua mansão, drogado e afogado.
Os Stones deram a volta por cima, transformando o concerto
em uma grande homenagem ao
companheiro morto.
Já exibindo músicas do magnífico álbum que tinha concluído,
"Let It Bleed", a banda iniciou turnê pelos EUA no dia 7 de novembro, fazendo 17 shows até finalizar
a série em Boston, no dia 29.
Empolgado, Mick Jagger convenceu os amigos a fechar o ano
com um grande show em lugar
aberto. Programado para o dia 5
de dezembro, no autódromo
Sears Point Raceway, o evento teve vários contratempos administrativos, que acabaram implicando a mudança de data e local.
No bem-sucedido concerto do
Hyde Park, os Stones utilizaram
os serviços dos Hell's Angels ingleses como seguranças da banda.
Resolveram repetir a dose nos
EUA, embora alertados por amigos da faceta mais barra-pesada
da facção californiana da gangue.
Quando a grande noite chegou,
deu tudo errado. A afluência de
público suplantou qualquer expectativa. Tanto que, até hoje,
ninguém sabe direito quantas
pessoas botaram os pés no autódromo. Algo entre 200 mil e meio
milhão, segundo vários relatos.
Apenas junto aos músicos os
Hell's Angels mostravam alguma
eficiência no trabalho de seguranças. Na platéia, os integrantes do
grupo bebiam, provocavam brigas e assediavam as mulheres.
O clima de tensão entre os motoqueiros e os hippies cresceu
com as primeiras atrações da noite. Flying Burrito Bros e Jefferson
Airplane, bandas de som viajandão, irritaram os Hell's Angels. Os
motoqueiros agrediram o vocalista do Jefferson, Marty Balin.
Ike e Tina Turner fizeram um
show curto e barulhento, e o Grateful Dead usou seu status de
maior banda do rock psicodélico
para ter o respeito dos motoqueiros. Mas a tensão foi crescendo
em torno do minúsculo palco.
Quando os Stones começaram a
tocar, duas mortes já estavam registradas pela equipe médica no
local. Mick Jagger escolheu uma
frase para introduzir a canção
"Sympathy for the Devil" ("Simpatia pelo Diabo") que ganhou
ares premonitórios: "Cada vez
que tocamos essa música algo
acontece, algo muito estranho".
Mas foi ao som de "Under My
Thumb" que a violência chegou
ao ápice. No meio de uma briga,
bem na frente do palco, Meredith
Hunter sacou uma arma. Os
Hell's Angels agiram com pronta
reação e fúria desmedida. Hunter
foi morto a facadas, golpes com
barras e pontapés. O palco foi invadido, o show já era.
Os Stones foram retirados no
meio de uma verdadeira operação de guerra, fugindo do autódromo em helicópteros.
A mídia bombardeou os Stones
nos dias seguintes. O saldo de
quatro mortos foi alardeado.
Mais uma vez, os Stones pagaram
a conta de sua geração. Afinal,
Woodstock teve três mortes, mas
todos só falaram de paz e amor.
O sepultamento da utopia hippie foi coroado 17 dias depois. O
grupo de fanáticos liderado por
Charles Manson matou a atriz
Sharon Tate e mais cinco pessoas
numa mansão na Califórnia. Qual
a música preferida de Manson?
"Gimme Shelter", mostrada pelos
Stones em Altamont.
Lançado no Brasil em vídeo em
1994, o documentário "Gimme
Shelter" mostra o que foi aquele
inferno, há 30 anos. O guitarrista
dos Stones Keith Richards tem
sua definição: "Não fui ao Vietnã,
mas estive em Altamont. Eu também sou um sobrevivente".
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