PEDRO BUTCHER
ENVIADO ESPECIAL A BERLIM

"Traveling with Che Guevara" ("Viajando com Che Guevara") ambiciona muito mais do que ser um simples making of de "Diários de Motocicleta". Além de mostrar cerca de dez minutos do esperado filme de Walter Salles e trazer muitas seqüências de bastidores, fica evidente o desejo do diretor italiano Gianni Minà de construir uma ponte entre ficção e realidade.
Minà estabelece constante paralelo entre a viagem realizada em 1952 pelos jovens Ernesto Guevara de la Serna e Alberto Granado e aquela feita por uma equipe de filmagem exatamente 50 anos depois, para recriar, diante da câmera, os relatos dos jovens viajantes em seus diários.
Para a sorte de Minà, Alberto Granado, hoje com 81 anos, acompanhou as filmagens e observou, de perto, a representação de sua própria história e a de seu amigo Ernesto naquela que teria sido uma viagem decisiva na transformação do estudante de medicina de classe média argentina Ernesto no revolucionário Che. O documentário flagra Rodrigo de la Serna (que interpreta Alberto), Gael Garcia Bernal (Che) e o diretor Walter Salles consultando Granado a respeito de uma cena específica ou mesmo de uma emoção específica.
Os depoimentos de Granado, que transborda bom humor, reservam os momentos mais ricos e originais de "Traveling...". É Alberto a verdadeira estrela do filme, ainda que a figura de Che, ora como um mito, ora como um fantasma, perpasse toda a projeção.
É nesse ponto que se pode ver como Minà desperdiça o potencial do material que tem nas mãos. A burocrática narrativa em inglês e o excesso de música de fundo não incomodam tanto quanto a forte sensação de que alguns momentos cruciais da viagem e dos depoimentos estão de fora da edição final. Não é raro uma entrevista ser abruptamente interrompida quando estava começando a ficar interessante.
Isso e, talvez, a necessidade de se prender à cronologia da viagem, deixaram "Traveling..." preso a uma camisa de força que quase o reduz a um making of tradicional.