São Paulo, sábado, 07 de abril de 2001

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6º FESTIVAL É TUDO VERDADE

"SOUTHERN COMFORT"

Diretora fala à Folha sobre o transexual que serviu de tema ao seu filme, vencedor em Sundance

Kate Davis registra adeus de transgressor

BRUNO GARCEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

Robert Head é um caubói de meia-idade, pai de dois filhos, que enfrenta um câncer terminal. Ele é o tema do documentário "Southern Comfort", vencedor do grande prêmio do júri no último Festival de Sundance. Mas a produção, que passa hoje no Festival É Tudo Verdade, não trata do Velho Oeste agonizante ou de um típico homem norte-americano.
Robert Head é chamado de "mãe" por seu filho mais velho e foi batizado como Barbara. De fato, ele sofre de câncer... no ovário.
Assim como sua parceira, Lola, Robert é um transexual, nascido no tradicional Estado sulista da Georgia. A diretora do filme, Kate Davis, conta em entrevista à Folha como conheceu seu protagonista e o que a levou a realizar "Southern Comfort".

Folha - Como você conheceu Robert e soube de sua história?
Kate Davis -
Eu o conheci em uma convenção de mulheres que se converteram em homens, em Maryland, quando gravava um documentário para a rede A&E sobre pessoas "transgênero" que lutavam por seus direitos civis.
Encontrei pessoas interessantes, com histórias comoventes, mas ninguém me impactou tanto quanto Robert.
Talvez tenha sido uma combinação de seu charme, humor e aparência de caubói com sua trágica luta para encontrar um médico que tratasse seu câncer de ovário. Achei que, se ele não conseguisse romper com os estereótipos ligados aos transexuais, ninguém mais conseguiria.
Robert entendeu que, ao contar sua história para o mundo, talvez sua morte não fosse em vão e ajudasse a abrir corações e mentes.

Folha - O que julgou mais interessante a respeito dele, sua vida transgressora ou o preconceito que ele encarou?
Davis -
Eu amei a forma como ele viveu plenamente a vida que escolheu. A despeito das perdas e riscos, Robert teve a coragem de ser sincero com ele mesmo. O mais interessante do preconceito é que ele incide sobre algo que não é nada ameaçador.
Há terroristas e serial killers lá fora, mas cabe a um homem com genitália feminina gerar ódio e aversão. Isso demonstra insegurança por parte de alguns heterossexuais.

Folha - Quais suas principais preocupações ao fazer o filme?
Davis -
Tinha receios de que o filme fosse muito obscuro para a platéia e estou vendo que é o contrário. Robert passa pelo "homem comum", daí as pessoas se identificarem com ele.
Por vezes julguei desconfortável estar registrando os últimos momentos de sua vida, especialmente quando o acompanhei no hospital. Mas ele entendeu a importância disso para o filme. Em certo ponto, Robert perguntou até se eu queria filmar a sua cremação.

Folha - "Southern Comfort" teve baixo orçamento e foi gravado em vídeo. O tema controverso afugentou produtores?
Davis -
Não fui atrás de produtores e nem mesmo busquei recursos. A equipe de produção se resumia a mim e outra pessoa. Eu gravei todas as imagens.



Filme: Southern Comfort
Direção: Kate Davis
Quando: hoje, à meia-noite
Onde: Cinesesc (r. Augusta, 2.075, São Paulo, SP, tel. 0/xx/11/3064-1668)
Quanto: entrada franca




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