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TEATRO
Espetáculo do canadense Robert Lepage marca a primeira direção de Monique Gardenberg e traz intérpretes da TV
"Rio Ota" mergulha no experimentalismo
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
Imagine um elenco estelar com
Giulia Gam, Maria Luísa Mendonça, Caco Ciocler, Beth Goulart
e Vera Zimmermann, entre outros atores, devotados a um grupo
de teatro experimental, virando a
madrugada em ensaios para um
espetáculo que dura cinco horas e
seu enredo não enfeixa papel
principal -todos estão no mesmo plano sob a mira dos holofotes.
A montagem brasileira da peça
"Os Sete Afluentes do Rio Ota",
criação conjunta do encenador
canadense Robert Lepage e do seu
grupo Ex Machina, aportou no
país no ano passado, no Rio, com
parte dos atores compartilhada
com gravações de novelas.
De largada, o projeto contraria
inclinação de profissionais vinculados à TV para produções teatrais de apelo meramente comercial.
Tudo sob a chancela de Lepage,
um dos artistas mais inovadores
da cena internacional nos anos 90,
adepto da fusão de linguagem
multimídia no palco.
O projeto é ancorado pela produtora e cineasta Monique Gardenberg, que estréia como diretora teatral (função que assina com
a atriz Michele Matalon). A partir
de hoje, o Sesc Anchieta concentra a diversidade de gerações e de
escolas de interpretação que entram em cena para defender um
épico de heróis de carne e osso.
"Rio Ota" (1996) colhe retratos
da segunda metade do século 20,
entrecruzando a vida de sete personagens em pontos diferentes do
mundo. Hiroshima, cidade japonesa atingida pela bomba atômica
em 1945, serviu de ponto de partida e chegada. Ao visitá-la, Lepage
deparou com uma população
reerguida daquela tragédia -há
o ritual de acender "lanternas" e
despachá-las sobre as águas do
Rio Ota, que a atravessa.
A peça é dividida em sete partes.
Vai de 1945 a 1997, com ações em
Nova York, Osaka, Amsterdã e
Terezin, cidade da atual República Tcheca, transformada em campo nazista à época.
Exemplo de especificidades do
elenco são Helena Ignez, 64, diva
do cinema novo, e Maria Luísa
Mendonça, 33, afastada dos palcos havia oito anos. Ignez é a judia
Jana Capek na velhice, convertida
ao budismo, uma monja, enquanto Mendonça dá conta da outra
ponta da vida da personagem,
agora na pele de uma menina de
11 anos. "Ela tem a essência do
brincar que está implícito no jogo
teatral", diz Mendonça.
Em Terezin, para onde os judeus foram deportados, a menina
se entretém com um mágico (Pascoal da Conceição), um lampejo
de lirismo. Conceição atuou em
várias montagens do grupo Oficina, de José Celso Martinez Corrêa.
Quem também trabalhou com o
diretor foi Giulia Gam, que interpreta a cantora de ópera Ada Weber numa das partes mais dramáticas, quando um grupo de pessoas se despede do amigo que
morre vitimado pela Aids.
"A gente se apropria da experiência do grupo do Lepage para
colocar as nossas", diz Gam, 36,
que define o projeto como uma
"ópera" (de fato, sua personagem
mais velha é vivida pela cantora
Madalena Bernardes), por causa
da exigência dos intérpretes e da
encenação, que faz uso de projeções de imagens na recriação cenográfica de Hélio Eichbauer.
Beth Goulart, 42, destaca a dualidade recorrente na dramaturgia:
Oriente e Ocidente, drama e comédia, vida e morte.
OS SETE AFLUENTES DO RIO OTA. De:
Robert Lepage e grupo Ex Machina.
Tradução: Sérgio Maciel e Sandra
Lagnado. Direção: Monique Gardenberg.
Com: Jiddu Pinheiro, Charly Braun,
Lorena da Silva, Gilles Gwizdek, Thierry
Tremouroux e outros. Onde: teatro Sesc
Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, tel. 0/xx/
11/3256-2281). Quando: estréia hoje,
para convidados, e amanhã para o
público em geral; sex., às 21h; sáb., às
19h; e dom., às 18h. Quanto: R$ 30. Até
6/7.
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