São Paulo, quinta-feira, 07 de junho de 2007

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Ocidente oriental

Ingredientes da cozinha asiática, como nirá, shissô, wasabi e folha de arroz, são incorporados a receitas de restaurantes de gastronomia francesa e italiana

JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL

A aparência é de um risoto de frutos do mar como outro qualquer, italianíssimo. Uma espiada na mise en place do restaurante Pomodori e... surpresa! Lá estão ingredientes orientais: hondashi, saquê, vinagre de arroz, togarashi, alga e raspas de peixe seco. A rã à provençal no menu do bistrô francês Allez, Allez! seria trivial não fosse pela presença de chá verde e massa de tempura na receita.
Em movimento semelhante ao vivido pelos restaurantes orientais em solo brasileiro, que souberam se adaptar ao gosto e aos produtos locais (usando, por exemplo, frutas nos sushis), muitas casas de gastronomia ocidental instaladas em São Paulo também têm aproveitado o que há de melhor entre os ingredientes asiáticos -como fazem há muitos anos os restaurantes contemporâneos- para agregar sabor, aroma e beleza às suas criações, sem por isto abrir mão da linha seguida em suas cozinhas.
"O mundo está tão globalizado, e a cozinha não poderia ficar de fora desta fusão entre Oriente e Ocidente", diz Luiz Emanuel, chef do Allez, Allez!.
Em seu bistrô, a influência asiática não se restringe ao pó de chá verde e à mistura de tempura das rãs. O clássico molho rôti leva óleo de gergelim torrado, e o gâteau de abóbora, que guarnece uma lagosta em emulsão de ouriço-do-mar, é feito com shissô e servido com ovas de massagô (leia ao lado).
"Minha cozinha é francesa, clássica na base, na técnica e nos preparos, mas tem espaço para a criação. Gosto de dar uma passeada, porém conservando o rigor da cozinha francesa. Até o chef Paul Bocuse faz receitas à la Oriente", diz.
Os restaurantes franceses, aliás, parecem ser os maiores partidários desta permuta intercontinental de ingredientes. No Marcel, ao menos dois pratos têm um pé na Ásia. Um deles é o lombo de cordeiro com rolinhos de legumes (o invólucro é a folha de arroz, bastante usada em receitas vietnamitas). Na lula em duas versões, uma é cozida em baixa temperatura, e a outra, crocante -efeito conferido pela massa de tempura.
"Perdeu-se um pouco deste rigor de um ingrediente ser de uma ou outra nacionalidade. O que interessa é ter um produto bom. O próprio Nobu Matsuhisa [conceituado chef japonês] usa mais foie gras do que peixe", diz o chef do Marcel, Raphael Durant Despirite. "É lógico que não vou fazer temaki de pato, mas se em algum prato a alga ficar legal, posso usar."

Shissô na sobremesa
Folha aromática empregada pelos japoneses em saladas e no sushi, o shissô aparece em uma sobremesa da chef Tatiana Szeles (ex-Bôa Bistrô). Trata-se de uma trufa de chocolate com calda de lichia e shissô.
Em alguns casos, são os pratos que ganham releituras. Com os ingredientes de um sashimi, Cássio Machado criou um prato no Di Bistrot e um sanduíche no B&B. O primeiro é um atum mi-cuit (semicozido) com creme de wasabi; e o outro, um burguer do peixe com wasabi e geléia de gengibre.
O wasabi também aparece no menu de uma casa italiana, o La Vecchia Cucina. É acrescido ao purê que acompanha o camarão com crocante de quinua ao molho de laranja e gengibre.
"A batata pode ganhar diferentes sabores, e o wasabi entra para dar contraste a este molho meio doce", diz o chef Sergio Arno, que recorre ainda ao shoyo, ao molho de ostra, ao saquê e ao queijo de soja. "No La Vecchia, os clientes esperam por sabores diferentes. Usamos ingredientes japoneses com técnica italiana."
Por mais italiano que seja, o Pomodori tem molho de ostra no fígado de boi ao Barolo; saquê e shoyo no molho do carpaccio de peixe; arroz japonês num bolinho italiano e togara- shi (pimenta vermelha parecida com a italiana peperoncino) na finalização de pratos. "Os ingredientes não têm nada a ver com a cozinha italiana, mas dão um sabor maravilhoso. A busca constante é pelo sabor", conclui o chef Rodrigo Martins.

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