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CRÍTICA
Regente dá vivacidade à orquestra
MARCELO MUSA CAVALLARI
da Redação
O melhor do violinista e regente
Pinchas Zukerman é que ele gosta
de música. A vivacidade e a alegria
com que regeu a English Chamber
Orchestra anteontem no Cultura
Artística revelaram tanto da música quanto da interpretação rigorosa das partituras apresentadas.
Zukerman fez a parte do violino
solo do concerto de Vivaldi "Il
Sospetto" e do "Concerto Opus
61" de Beethoven e regeu a sinfonia nš 92 "Oxford" de Haydn.
Com cacoete de solista de violino, que toca em pé e não pode chacoalhar a cabeça, Zukerman rege
com o corpo todo. Balança o tronco, mexe as pernas. Várias vezes
chega a dançar, quase.
Especialmente ver seus pés é
muito divertido. Ele os bate no
chão, bate os calcanhares, sem se
importar muito em estar adicionando alguns ruídos às peças.
Sua regência é mais sugestiva do
que propriamente um código de
gestos. Deve ser difícil para instrumentistas menos experientes, mas
funcionou maravilhosamente
com o clima de coletivo do concerto da English Chamber.
Os ingleses chamavam de "collective" conjuntos que tocavam
sem regente, e é quase isso que a
orquestra fez. No concerto de Vivaldi -para violino, cordas e baixo-contínuo- a maior simplicidade da peça não tornou tão nítida
a eficácia da orquestra e o grau de
entendimento entre solista e os demais instrumentistas.
Mas já estava lá a leveza e a alegria de tocar. Como um grupo de
amigos da música. Quase como
amadores, não especialistas. O regente sola, a clarinetista aproveita
a folga e toca a parte do cravo.
O concerto de Beethoven é uma
peça muito mais complexa, com
extensas passagens de desenvolvimento em que é preciso fazer ouvir
motivos, frases e contrapontos
executados ora nas vozes superiores, ora nas inferiores, ora no solo,
ora nos acompanhamentos.
É exatamente em momentos como esse que o regente é, em tese,
indispensável. A English Chamber
Orchestra fez tudo isso sozinha
com precisão e expressividade enquanto Zukerman solava de costas
para a orquestra.
Especialmente eloquente foi a
passagem em que o fagote glosa o
tema do rondó em diálogo com o
violino solo.
O brilho de Julie Price, até com
movimentação de solista, elevando-se do fundo da orquestra, emprestou um significado cênico
inesperado ao concerto.
Zukerman é um desses músicos
que vale a pena ver tocando ao vivo. Ver, mesmo, não apenas ouvir.
Sem deixar de ser um músico rigoroso, ele tem uma presença física
extremamente simpática.
Sua simpatia foi a responsável,
até, pelo único defeito do concerto
(uma entrada antecipada do violino de Zukerman no movimento final do concerto de Beethoven foi
um deslize quase imperceptível).
Zukerman não resistiu aos pedidos e concedeu um bis. Depois de
um programa tão bem imaginado,
em que a ordem cronológica foi
acompanhada por um crescendo
em complexidade composicional,
a pecinha divertimentosa de Mozart não deveria ter sido tocada.
Quando a platéia quis outro bis,
Zukerman dispensou-a com humor e elegância tocando a melodia
da canção de ninar de Brahms. Deveria tê-lo feito feito antes.
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