São Paulo, sexta, 7 de agosto de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ARTES PLÁSTICAS
Pintor revela ousadia nos atos e nas formas

CELSO FIORAVANTE
da Reportagem Local

Quatrocentos anos depois de ter produzido uma das mais originais e influentes obras pictóricas da história da arte, o mais importante mestre italiano do século 17, Michelangelo Merisi da Caravaggio, chega finalmente ao Brasil.
São apenas dois quadros, o que parece pouco, mas a grandiosidade do evento se revela de imediato, seja pelas qualidades estilísticas das obras, seja por essa mesma quantidade.
Duas telas de Caravaggio é muito. Raros são os museus, como a National Gallery, em Londres, que possuem essa quantidade em seu acervo, já que do pintor não existem mais que 40 trabalhos documentados, grande parte em igrejas e museus italianos.
Caravaggio (1571-1610), nome que retirou do vilarejo onde seus pais nasceram, representou uma verdadeira revolução na pintura.
Rebelde em todos os aspectos, o pintor ousou questionar noções pictóricas criadas, desenvolvidas e sedimentadas por mestres renascentistas e maneiristas, como Piero della Francesca, Leonardo da Vinci, Michelângelo e Rafael.
Caravaggio fez pouco caso da perspectiva, buliu com a luz, desdenhou do desenho e deu origem a uma obra em constante conflito com as convenções sociais, religiosas e artísticas de seu tempo.
Dono de um temperamento violento e intempestivo, dividiu-se entre a fama de gênio artístico e a de arruaceiro inveterado. Uma rebeldia que o fez ser "esquecido" por cerca de dois séculos e recuperado apenas no século 19, por artistas como Delacroix, Géricault e Courbet.
Caravaggio chocou a igreja da época com seus anjos de natureza andrógina, rapazes afeminados e retratos da Virgem em que usava uma prostituta, sua namorada Lena, como modelo. Tudo isso não constrangeu totalmente a igreja, já que ela precisava de uma aproximação maior com o público.
As representações religiosas deveriam ser o mais realistas possível para buscar essa proximidade. A religião e seus protagonistas não estão mais acima da natureza e da condição humana, como na produção dos renascentistas.
Por isso os personagens caravaggescos nascem nas ruas e se encontram nas tavernas, bebendo, jogando ou trapaceando.
Seus modelos são bêbados, ladrões, trabalhadores e prostitutas. Mesmo quando recusadas pela igreja, devido a seu tratamento pouco ortodoxo dos temas religiosos, suas obras eram rapidamente compradas por colecionadores particulares.
As obras, porém, não perdem totalmente a santidade. Suas cenas são dominadas por um intenso e dramático claro-escuro, em que os personagens são iluminados por raios de luz concentrada.
A luz, em Caravaggio, tem uma origem indeterminada e surge como aparição simbólica, algo que acentua a dramaticidade da representação.


Mostra: A Lição de Caravaggio (duas obras do pintor italiano e 33 de seguidores) Onde: Masp (av. Paulista, 1.578, Cerqueira César, tel. 011/251-5644) Vernissage: segunda, dia 10, às 19h (apenas para convidados) Quando: de terça a domingo, das 9h às 21h. Até 4 de outubro Quanto: R$ 8 e R$ 4 (estudantes). Crianças até 10 anos e maiores de 60 não pagam. Agendamento escolar pelo tel. 011/253-9663


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.