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"AS REGRAS DA VIDA"
Filme tira EUA do papel de juiz e o coloca no banco dos réus
TIAGO MATA MACHADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
A princípio , "As Regras do
Jogo" parece apenas mais
um daqueles filmes militaristas
feitos para ostentar o poderio bélico americano e atender à demanda do público nativo pelo velho teatro guerreiro. Mais uma celebração, portanto, do inquebrantável casamento entre as indústrias bélica e cinematográfica, responsável, em larga escala, pela hegemonia mundial americana.
É assim que os helicópteros do
Exército americano aproximam-se do Iêmen para salvar seu embaixador, ameaçado pelo surto de
alguns islâmicos fundamentalistas, nos moldes da velha e maniqueísta montagem paralela griffithiana. Mas, desta vez, ainda que a
família do embaixador e a maculada bandeira americana sejam
salvas, a nação não sairá incólume. O inimigo, a exemplo da saudável tradição hollywoodiana dos
anos 50, não está mais no exterior:
é o próprio instinto belicista americano, encarnado aqui no coronel Childers (Samuel L. Jackson),
um perfeito "animal de guerra".
Líder da tal operação de resgate,
o coronel, depois de sofrer algumas baixas, manda atirar na raivosa multidão árabe, chacinando
83 pessoas, crianças e mulheres
na maioria. Está deflagrada uma
crise internacional. Os EUA passam a ter sua representatividade
diplomática no Oriente Médio
ameaçada. Decidido a eximir-se
de responsabilidades, o governo
leva Childers ao tribunal. O jogo
será pesado.
Hollywood prova, mais uma
vez, em "As Regras do Jogo", que
pode passar sem novas safras de
grandes diretores (nada mais burocrático do que a direção de William Friedkin aqui), mas não de
bons roteiristas. E a grande jogada desse roteiro de Stephen Gaghan, inspirado numa história de
James Webb, é não deixar espaço
para a identificação do espectador. Entre o jogo sujo do governo
e o instinto homicida recalcado
do patriótico coronel, cuja exemplar carreira se erigiu sobre muitos cadáveres, só encontramos algum socorro no drama de consciência vivido pelo oficial encarregado de defender Childers, seu
ex-companheiro de front no Vietnã (Tommy Lee Jones).
Mas, sejam brancos ou negros,
militares de boa família ou de carreira, fundamentalistas ou embaixadores, todos mentem por aqui.
Cada um com suas regras, suas
prioridades e normas de conduta.
O que está em julgamento, afinal,
é a capacidade de uma América
hegemônica, tornada dona do
mundo, de normatizar suas próprias regras de dominação. Assim, o mundo inteiro será convocado a prestar testemunho neste
que se revela um bom e velho filme de tribunal americano. A diferença aqui é que a América já não
é juíza, mas ré.
As Regras do Jogo
Rules of Engagement
Direção: William Friedkin
Produção: EUA, 2000
Com: Samuel L. Jackson, Tommy Lee Jones, Ben Kingsley
Quando: a partir de hoje, nos cines Iguatemi 1, Marabá e circuito
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