São Paulo, quarta-feira, 07 de novembro de 2001

Texto Anterior | Índice

Obra do autor foi do "mau ao excelente"

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Leia a seguir trechos da entrevista inédita do crítico Antonio Candido que está no livro "Erico Verissimo: O Romance da História", em que ele faz um balanço da trajetória literária do autor. (MP)

Pergunta - Professor, falemos dos bons livros de Erico. Em primeiro lugar, quais são eles, na sua visão?
Antonio Candido -
Comecemos pelo começo, lembro que em 1980 fiz em Porto Alegre uma palestra sobre a importância da Revolução de 30 na cultura. Nela eu disse que, para a minha geração, o romance brasileiro dos anos 30 teve um papel extraordinário de revelação do Brasil, quebrando o isolamento das regiões e mostrando a realidade diversificada de seu conjunto. Nesse sentido, os livros de Erico foram antes de mais nada uma espécie de revelação do Rio Grande do Sul (...).
Eu não lera "Clarissa", mas li encantado "Música ao Longe". Em seguida li "Caminhos Cruzados". A técnica narrativa nos fascinou, e percebemos que ali estava um escritor que sabia ver a sociedade com olhos retos (...).

Pergunta - Como o sr. definiria, ou melhor, o que unificaria esse tipo de boa literatura que ele estaria fazendo nesse conjunto de obras?
Candido -
(...) Há, em primeiro lugar, a simplicidade expressiva de sua prosa, que traduz uma visão íntegra e correta da realidade. Em seguida, é preciso salientar um traço importante: a sua capacidade de inserir bem o tempo na estrutura literária, seja injetando-o no tecido da narrativa, seja quebrando-o por meio do relato descontínuo. Aí ele geralmente acerta a mão. Um terceiro traço positivo é a capacidade de se tornar convincente tanto para o leitor culto quanto para o leitor mais simples. Isso o aproxima da família espiritual de escritores como Eça de Queirós, Dickens e Balzac.
Por causa desse último traço, desenvolveu-se em relação a ele um certo esnobismo segundo o qual seria escritor de segunda ordem, por ser fácil. Isso me irritava um pouco.
Quando chegamos a "O Tempo e o Vento" sentimos que Erico finalmente alcançou a sua melhor forma (...). A irregularidade que faz a obra de Erico se escalonar do mau ao excelente talvez seja uma das causas da sua voga e do seu êxito junto ao público.
Entrando um pouco pelo paradoxo, seria talvez possível dizer que, sob esse ponto de vista, as suas fraquezas podem ser uma força, porque desvendam a sua humanidade e assim o aproximam do nosso falível gabarito.



Texto Anterior: Literatura: Críticos começam a ler Erico Verissimo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.