São Paulo, sexta-feira, 07 de dezembro de 2001

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MÚSICA

"Sweet Tea", novo disco do guitarrista lançado no Brasil pela Zomba Records, mergulha no estilo rústico do Mississippi

Buddy Guy abre novas trilhas para o blues

EDSON FRANCO
EDITOR DE IMÓVEIS E CONSTRUÇÃO

Há alguns benefícios à espera de quem chega aos 65 anos. Aposentadoria, carteirinha para o ônibus, descontos na farmácia. Em vez de aproveitar isso, o guitarrista norte-americano Buddy Guy, 65, resolveu sacudir a poeira e mostrar que ainda pode abrir novas searas para o velho blues.
Enquanto a maioria dos seus colegas lança discos com convidados vindos do pop, Guy foi para um estúdio num rincão isolado do Mississippi, juntou músicos tão desconhecidos quanto o repertório explorado e voltou de lá com o revigorante CD "Sweet Tea", lançado em maio nos EUA e que agora aporta por aqui.
No álbum, ele soa mais Buddy Guy que nunca. Energético, incisivo, desavergonhado, íntimo e intocável ao mesmo tempo. Mas, pelo que disse por telefone à Folha, ele teve muito a ver com o resultado final, mas pouco com o plano original. "Foi uma idéia do produtor Dennis Herring e da gravadora. Eu não sabia nada a respeito de gente como Junior Kimbrough, R.L. Burnside e T-Model Ford. Ouvi o máximo que pude desse tipo de música e fui para o estúdio."
Os músicos citados por Guy são contratados do selo Fat Possum -que agora está sendo distribuído no Brasil pela Sum Records- e fazem um tipo de blues rústico, com pouca ou nenhuma mudança de acordes e insistente como um mantra na repetição.
"Nesse estilo, o que mais importa é o "groove". Quando fui para Chicago [1957", foi-me ensinado tudo sobre mudanças de acordes e refrões. Tive de reaprender a tocar de um jeito mais básico. Fiquei preocupado e falei para o produtor que eu achava que não conseguiria. Ele me acalmou dizendo que minha tarefa era apenas tocar Buddy Guy sobre esse blues do norte do Mississippi."
Segundo o guitarrista, o que tornou mais difícil seu reaprendizado foi o fato de não haver rádios e TVs que toquem blues nos EUA.
"Não sou muito diferente dos adolescentes que ouvem rádio e tentam imitar aquilo na garagem. É por isso que eu dou tudo no palco, para tentar deixar mais jovens interessados pelo blues."
"A maioria dos shows acontece em clubes onde só são permitidas pessoas com mais de 21 anos. Nem meus filhos podem entrar. Às vezes, vão a um show aberto e dizem: "Nossa, pai, não sabia que o senhor tocava desse jeito'".

Timbres
De volta a "Sweet Tea", uma de suas características mais notáveis é a variedade de timbres. Isso decorre da miríade de amplificadores usados, muitos fora de linha há décadas. Não houve truques ou pedais de efeito nas gravações. "No estúdio onde gravamos, não havia nada capaz de fazer você soar como algo que você não é."
Apesar de estar recebendo "as melhores críticas da minha carreira", Guy não se ilude quanto à possibilidade de "Sweet Tea" rivalizar em vendas com estrelas pop. Para ele, embora às vezes apareça um músico jovem que faça as pessoas revisitarem o blues, o estilo está fadado a jamais chegar ao topo das paradas. É por essas e outras que, além de passar dias em estúdios, ele mantém uma agenda de shows recheadíssima e administra seu clube de blues em Chicago, o Legends.
"O movimento do clube caiu bastante depois dos ataques de 11 de setembro, mas as coisas estão melhorando. Chicago é uma cidade que recebe muitas convenções. Assim, é muito fácil você encontrar engravatados bebericando no Legends." Para encerrar a conversa, o guitarrista fala de maneira esperançosa sobre a possibilidade de mostrar o repertório de "Sweet Tea" aos brasileiros. "Se vocês me convidarem amanhã, estarei aí no dia seguinte."


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