São Paulo, quarta-feira, 07 de dezembro de 2005

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LENNON, 25 ANOS DEPOIS

Produtor irlandês acredita que uma conversa entre Lennon e o assassino teria evitado o crime

Documentário revê tormentos de Chapman

Itsuo Inouye - 9.dez.2002/Associated Press
Fãs no museu John Lennon, no Japão


FÁBIO VICTOR
DE LONDRES

Dois dedos de prosa poderiam ter evitado uma das maiores tragédias da música pop mundial. Se é possível levar a sério a mente de um psicopata como Mark David Chapman, é dele -o homem que deu cinco tiros em John Lennon em 8 de outubro de 1980 (há 25 anos e um dia)- a idéia de que o desdém do ex-Beatle aos seus tormentos foi a senha para o crime.
A declaração é um dos pontos altos do documentário "I Killed John Lennon" ("Eu Matei John Lennon"), produzido pelo irlandês David Harvey a partir de depoimentos do próprio Chapman, que já teve negados dois pedidos de liberdade condicional e cumpre pena na prisão de Attica, no Estado de Nova York.
Ex-apresentador de um programa sobre crimes na TV irlandesa, Harvey comprou os direitos de usar as fitas de áudio ao americano Jack Jones, que gravou, a partir de 1990, mais de cem horas de entrevistas com o assassino -os produtores se debruçaram sobre 40 horas, e no filme restaram só 25 minutos de relatos dele.
Com 65 minutos, o documentário, dirigido por Chris Wilson, vai ao ar amanhã no inglês Channel 4 (segundo o produtor, o filme ainda não foi negociado com canais brasileiros). Ouvindo também pessoas próximas a Chapman e testemunhas do crime, reconstitui o dia do tragédia e investiga obsessões do assassino, como a com o livro "O Apanhador no Campo de Centeio", de J.D. Salinger, que o teria inspirado.
Embora Jones tenha usado seus encontros com Chapman para escrever a biografia "Let Me Take You Down", os realizadores asseguram que a maior parte dos depoimentos no documentário é inédita. Alguns, como o que diz que nada poderia tê-lo impedido de matar Lennon, pois era "como um trem descontrolado", contradizem a própria tese da conversa salvadora, mostrando o quão atormentado é o sujeito.
Pela venda dos direitos ao Channel 4 e à americana NBC, a empresa de Harvey abocanhou, segundo o jornal inglês "The Sunday Times", 500 mil. Em entrevista à Folha, o produtor negou, mas se recusou a dizer quanto pagou a Jones e quanto recebeu das TVs. Ele falou de Dublin, onde acabou de inaugurar um canal de TV, o City Channel.
 

Folha - Como chegou às fitas?
David Harvey
- O Jack Jones é jornalista em Nova York e foi contatado por Mark Chapman, que leu os trabalhos dele sobre prisioneiros e achou que seria alguém confiável para conversar. Eles se encontraram diversas vezes, e Jones gravou cem horas de entrevistas. Eu já conhecia o Jones de outro projeto, e resolvi fazer.

Folha - Qual é a maior revelação de Chapman no filme?
Harvey
- É que ele não teria matado se tivesse tido a chance de conversar com Lennon para resolver todo o tormento que tinha em sua cabeça sobre a relação com ele. Isso seria impossível, já que Lennon não toparia conversar com um fã sobre um assunto desses. Chapman estava sendo conduzido por uma série de desilusões em sua mente que o conduziram ao assassinato. Ele conta que foi guiado por amigos imaginários que eram o seu alter ego.

Folha - E o que os outros falam dele?
Harvey
- As observações mais interessantes são dos especialistas que avaliam o estado de saúde de Chapman hoje. Dizem que ele é até certo ponto normal, mas acham que suas características de desilusão e narcisismo continuam evidentes. Poderíamos ter feito cinco documentários. A vida dele é muito enrolada. Mas o nosso propósito era fazer uma versão resumida, deixar que ele contasse sua história. E também não tivemos permissão para fazer entrevistas com algumas pessoas.

Folha - A família Lennon, por exemplo, não foi ouvida...
Harvey
- Não. Yoko Ono não está muito satisfeita. Tentamos entrevistá-la, ela não quis.

Folha - Como vê as críticas dela, de que mostrar o documentário irá ferir a família e os fãs?
Harvey
- Bem, ela não assistiu. Então acho que as críticas são infundadas. De forma alguma o que estamos fazendo glorifica Chapman ou desrespeita a memória de Lennon. É uma reconstituição documental.


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