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CRÍTICA
Roqueiro é asfixiado pelo próprio grito
DA REPORTAGEM LOCAL
Ele tem lá suas justificativas
para legitimar o novo disco,
mas é impossível não desconfiar
que Lobão morde a própria cauda ao lançar "Lobão 2001 - Uma
Odisséia no Universo Paralelo".
Por mais razões que possua
para fazê-lo, seu disco é, ainda
assim, aparentado de tudo que o
artista rebelde critica com entusiasmo desde que adotou a postura de cabeça pensante num cenário musical cheio de "teletubbies", como ele próprio andou
gostando de definir seus colegas.
Afora sair em 2002, o seu parece um disco ao vivo verdadeiro,
mas ainda assim é um disco ao
vivo, que participa de um cenário poluído por caça-níqueis às
vezes displicentes, às vezes fraudulentos, quase sempre repetitivos e redundantes, quase nunca
inspiradores. É difícil que Lobão
consiga se diferenciar do cenário
pavoroso que ele enxerga tão
bem apenas no grito.
Quase todo de regravações, o
disco privilegia canções recentes, acrescidas de peso e sujeira.
O caráter retrospectivo, que em
seu caso até faria sentido (porque seus discos estão quase todos escondidos nos baús das
gravadoras) fica assim relativizado. Entre os sucessos que Lobão aceita abrigar em sua odisséia, como "Decadence avec Elegance", "Noite e Dia"/"Me Chama", "Rádio Blá" e "Vida Bandida", o esforço é de subverter os
originais, adequando-os ao projeto de peso e sujeira do CD.
No resultado final, porém, Lobão soa bravo, irritado, gritão,
como vinha sendo mais no discurso que na musicalidade. Se
esse poder de briga é um de seus
trunfos permanentes, fica ambíguo vê-lo reverter tal característica em música.
O ímpeto briguento, por fim,
repercute artisticamente em
mais um outro detalhe: a voz de
Lobão. O roqueiro brasileiro
canta de boca grande, desengonçado, afoito, às vezes ofegante,
turvando nessas aflições a braveza e a bravura de sempre.
Cria-se bela metáfora: de tanto
ter de gritar para se fazer ouvido,
talvez Lobão se sinta asfixiado,
incomodado pela necessidade
do berro. Sua música é esclarecedora, mesmo quando mimetiza cacoetes do mercadão que há
anos o isola. Que "Uma Odisséia
no Universo Paralelo" possa ser
útil para encher de ar os pulmões de um dos artistas ainda
mais participantes da música
nacional.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Lobão 2001 - Uma Odisséia no
Universo Paralelo
Artista: Lobão
Lançamento: Universo Paralelo
Quanto: R$ 11,90 (nas bancas de jornal
na segunda quinzena de janeiro)
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