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CRÍTICA
Ruas da cidade se tornam becos sem saída
CRÍTICO DA FOLHA
Vista de cima, recortada por uma lenta e cerimoniosa panorâmica, Marselha, cidade portuária mediterrânea, parece mesmo
tranquila. Mas o diretor Robert Guédiguian não precisa
nem mesmo descer até os
becos sem saída de Marselha
para que entendamos a ironia de seu título, "A Cidade
Está Tranquila".
Na cobertura de um prédio, um velho político de esquerda flerta, sob o olhar da
mulher, com a filha de um
senador da nova direita
francesa num coquetel de
confraternização, enquanto
estivadores protestam contra o desemprego iminente.
O fato de o personagem se
prestar a coquetéis com políticos da nova direita prova
que, mais do que desiludido,
é um cínico pragmático. Não
há desilusão no fato de passar a ecoar o discurso neoliberal de que a história (a pequena e a grande) acabou.
Há apenas arrivismo. Sua
mulher o acusará de usar o
povo como conceito abstrato (antes revolucionário, hoje reacionário) para justificar
a obsessão pelo poder.
O problema é que as ruas
de "A Cidade Está Tranquila" só desembocam em becos sem saída. Os encurralados do filme fogem de um
para cair em outro. Guédiguian desce ao rés-do-chão
para nos revelar a catástrofe
humana em cada um dos
personagens para depois
nos fazer ver neles um pouco
da beleza do movimento
inelutável da vida.
O certo é que a (pequena)
história nunca acaba, como
se vê nos exemplos de uma
operária, que acaba envolvida com drogas e prostituição, e de um ex-estivador,
que fracassa como taxista.
Os dois ensaiam uma relação, mas, numa sociedade
assim desumanizada, quase
moribunda em sua reificação, o amor simplesmente já
não parece mais possível.
(TIAGO MATA MACHADO)
A Cidade Está Tranquila
La Ville Est Tranquille
Direção: Robert Guédiguian
Produção: França, 2000
Com: Ariane Ascaride, Jean-Pierre
Darroussin, Gérard Meylan
Quando: a partir de hoje no
Unibanco Arteplex e no Cineclube
DirecTV
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