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CRÍTICA
Dança Brasil 2004 renova os espaços do corpo
INÊS BOGÉA
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA
"O espaço é um aspecto escondido do movimento, e
este, um aspecto visível do espaço", dizia Rudolf Laban (1879-1958). A frase poderia servir de
mote para o Dança Brasil 2004, "O
Espaço que (nos) Inspira", que
tem sua oitava edição no Rio de
Janeiro e terceira em Brasília. Em
cena, serão sete coreografias
abordando maneiras de se "relacionar com a dimensão espacial":
Basirah (DF), Kaiowas (SC), Luciana Gontijo & Margô Assis
(MG), Thembi Rosa (MG), Cia.
Carlota Portella - Vacilou Dançou
(RJ), Celina Portella & Flávia Costa (RJ) e Zikzira Physical Theatre
(MG/Inglaterra).
Quem abriu a temporada em
Brasília e estréia hoje no Rio foram as companhias Basirah, com
"Eu Só Existo Quando Ninguém
me Olha", e Kaiowas, com "Pausa". O espaço é branco em "Só
Existo..." -colchão, cadeira, vaso
sanitário-, onde três bailarinos
revelam intimidade e solidão. De
situações caseiras como tomar
chá ou conversar com uma planta, ou se vestir ou se despir, passa-se a uma dança fluida, com mudanças de ritmos e de direção,
chegando a quedas e à volta ao cotidiano, com movimentos mais
lentos, espichados. Tudo sugere a
turbulência interior, mesmo na
aparente calma ou tédio. Ao fundo, um vídeo: uma faca cortando
incessantemente legumes.
Talvez ainda escape ao espetáculo um sentido mais dramático
de organização das partes, para
alcançar suas tensões. As relações
propostas entre transparência e
opacidade, sugestão e revelação,
movimento e imobilidade nem
sempre chegam a termo; tudo se
passa num tempo quase linear,
com cenas que se sucedem sob
risco de se esvaziar de sentido.
É um risco de outra ordem que
se vê em "Pausa". O espaço do
chão é dividido por cores (branco,
vermelho e preto) e os movimentos violentos põem o corpo em situação de perigo. Karina Barbi,
diretora do Kaiowas, é integrante
do Cena 11 de Florianópolis, e
muito do que faz traz marcas desse outro trabalho. As sucessivas
quedas, de braços abertos e rosto
voltado para o chão, são uma
constante aqui como lá. O uso de
apoios, do peso do corpo e das
possibilidades de relação entre
um corpo e outro também são
cruciais.
Quatro mulheres retratam a
violência pelas quais os corpos
passam, num palco de chão geométrico, inspirado na obra do
pintor holandrês Piet Mondrian
(1872-1944). Tudo é bem cuidado
e estudado; aqui e ali a repetição
excessiva e/ou a violência nos gestos oculta a suavidade e engenhosidade das construções. No início,
o plano inclinado favorece a construção da relação e da investigação, retomada depois no uso do
biombo, com a experimentação
do peso dos corpos e de sua capacidade de sustentação no ar. Do
movimento no espaço à geometria dos planos, são outras possibilidades de perceber a vida dos
corpos em movimento.
Dizer que essa dança trabalha o
espaço é muito pouco e muito geral; mas o modo como trabalha
lhe dá singularidade e sentido.
Quem olha, de fora para dentro,
se vê olhado de dentro para fora.
Os movimentos nos decifram,
percorrendo a seu modo a trajetória do visível ao invisível e permitindo uma renovação, mais uma
vez, do que se pensava articulado
e pronto.
A crítica Inês Bogéa viajou a convite da
produção do evento.
DANÇA BRASIL 2004. Onde: CCBB - Rio
(r. Primeiro de Março, 66, RJ, tel: 0/xx/
21/3808-2020); Brasília (SCES, trecho 2,
conjunto 22). Quando: até 25/4 (Brasília);
até 2/5 (Rio). Quanto: Rio: de R$ 5 a R$ 10;
Brasília: de R$ 7,50 a R$ 15. Programação
completa no site www.dancab.com.br.
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