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BIA ABRAMO
MTV faz versão pop de "reality show"
Com problemas juvenis modestos, "Quebra-Galho" tem tom mais leve e divertido
É CURIOSO que, no mundo do
hiperconsumo, as pessoas se
sintam tão desamparadas para decidir o que e como consumir.
Curioso, mas num certo sentido,
compreensível: uma vez que o consumo joga um papel decisivo na definição das identidades (diga-me o
que compras e te direi quem és), errar nesse terreno é muito arriscado.
É nessa espécie de imaturidade
-no sentido de que a constituição de
uma identidade pessoal e autônoma
é, ou era, uma das tarefas do crescimento psíquico- que se baseiam os
"realitys" do tipo "resolvemos sua
vida". São um sucesso: a televisão,
como uma mãe generosa, solícita e
de bolsa aberta, está aí para ajudar,
qualquer que seja o tamanho de seu
problema.
A MTV acaba de estrear uma versão pop desse tipo de "reality show".
Chama-se "Quebra-Galho" e ajuda
seus participantes a realizarem pequenos desejos - "quero acampar",
"quero fazer um book", "quero ir a
uma balada com o Nxzero" e por aí
vai. A MTV designa um "especialista
-os há para qualquer galho, acreditem se quiser- e uma verba de R$ 50
para gastar.
A modéstia dos problemas e exigüidade de dinheiro, além da extrema juventude de seus participantes,
dão um tom mais leve e divertido ao
"reality show" da MTV. Mas também é tudo de uma bobagem que
resvala o non - sense: por que será
que essa meninada não consegue fazer o que quer? Por que será que o
mundo é tão complicado? De onde
vem tanta insegurança e dependência?
A juventude, tal como a conhecíamos no passado, era o momento de
correr riscos existenciais de várias
espécies como uma forma de celebrar a independência e autonomia.
Pelo jeito não é mais.
Esses meninos e meninas que aparecem na MTV querem risco zero.
Boninho, o diretor do "BBB" entrevistado por Laura Mattos domingo passado, acha que a crítica "insiste em desacreditar" o programa. Não
é o que esta coluna observa: desde
que o programa estreou, em 2002,
não há edição que não receba pelo
menos um comentário das colunas
de TV, esta inclusive.
O problema é que a Globo, criada
com a expectativa de monopólio
eterno e na fantasia delirante da audiência de 100%, não entende que
considerar o fenômeno relevante e,
portanto, digno de atenção e reflexão, não é mesma coisa que "falar
bem" ou "achar bom".
É típico: diante de qualquer observação crítica, as emissoras brandem
números de audiência e o assunto
está encerrado.
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