São Paulo, segunda-feira, 08 de maio de 2000


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PATRIMÔNIO CULTURAL
Pilares do viaduto do Gasômetro, com escritos e pinturas do artista de rua, são restaurados
Rio tomba murais do "profeta Gentileza"

Zulmair Rocha/Folha Imagem
Pilar do viaduto do Gasômetro (RJ), com texto do 'profeta Gentileza


ELVIRA LOBATO
da Sucursal do Rio

Os 55 pilares do viaduto do Gasômetro (na zona portuária do Rio) que contêm os escritos deixados por José Dantrino, o ""profeta Gentileza", serão tombados para preservação dos murais.
O tombamento foi anunciado pelo diretor do Departamento de Patrimônio Cultural do município, Alex Nicolaeff, no sábado, quando os trabalhos foram entregues ao público após terem sido restaurados por alunos da Faculdade de Artes da Universidade Federal Fluminense.
Segundo Nicolaeff, o tombamento será a consagração dos escritos como expressão de arte popular e impedirá que sejam destruídos, como quase aconteceu em 97, quando a Comlurb (Companhia de Limpeza Urbana) jogou cal sobre eles para limpar as pilastras.
Gentileza foi um personagem do Rio. Andarilho, messiânico, passou 35 anos nas ruas pregando a gentileza e suas virtudes e se autodenominou "profeta". Aos que o chamavam de louco, respondia: ""Sou maluco para te amar e louco para te salvar".
Nicolaeff relaciona os escritos de Gentileza à arte rupestre. Diz que ele usou os pilares do viaduto como pedras artificiais e fez suas pinturas em locais protegidos do sol e da chuva.
"É uma obra com diagramação inteligente. Os pilares são usados como páginas de um livro e os escritos têm ângulo e altura certos para que possam ser lidos pelos passageiros que estão dentro dos ônibus", diz o diretor. Os murais, em cores, expressam o pensamento do andarilho. A bandeira nacional e uma estrela amarelada estão presentes em todas as pinturas e pequenos aviões interligam as mensagens.
Coordenador do projeto de restauração dos murais, o professor Leonardo Guelman, da UFF, diz que os pilares são um "livro urbano, uma obra única", que convida o visitante que chega à cidade a uma reflexão sobre a violência. Segundo o professor, os murais foram pintados entre 1980 e 1990 e estão numerados por ordem cronológica. Em um deles, Gentileza refere-se a si mesmo como "maluco beleza", mostrando que se identificava com Raul Seixas. Há referências também a Brizola, a Collor, a vereadores e deputados.
Guelman destaca ainda a presença de símbolos religiosos. Letras "r" e "s" são replicadas, em referência à Santíssima Trindade.
Além da restauração dos escritos e do pedido de tombamento dos pilares, a vida de Gentileza será tema do samba-enredo da escola de samba Unidos da Grande Rio no ano que vem. O enredo foi escolhido pelo carnavalesco Joãosinho Trinta, que costumava seguir o andarilho pelo centro ouvindo suas pregações.


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