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BIENAL DE ARTES DE VENEZA
Em visita a São Paulo, Francesco Bonami critica os museus e as exposições "blockbuster"
Curador ataca a "ditadura do público"
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
A próxima Bienal Internacional
de Artes Visuais de Veneza, que
será aberta em 15 de junho com o
tema "Sonhos e Conflitos", pretende reinstaurar uma relação entre o observador e a obra de arte.
O curador-geral Francesco Bonami disse à Folha: "As exposições "blockbuster", que muitos museus têm organizado, passaram a relacionar-se com uma entidade abstrata, o público, tentando atuar como máquinas de publicidade e descobrir o que esse público deseja. Com "A Ditadura
do Observador" [subtema da bienal], busco propiciar ao indivíduo
a experiência da arte, colocando a
imaginação do observador frente
à imaginação do artista".
Para tanto, o curador selecionou oito assistentes, entre eles a
francesa Catherine David e o argentino Carlos Basualdo, que irão
organizar exposições dentro da
bienal sem pretender uma unidade. "O observador irá de uma realidade para a próxima e terá seu
próprio tempo. Com isso, a memória irá reprocessar todo esse
movimento, com o que espero
afastar as acusações de que a bienal não é viva", afirma Bonami.
Tal modelo não é novo, foi utilizado por Paulo Herkenhoff na 24ª
Bienal de São Paulo, em 1998, na
qual o curador italiano esteve presente e afirmou ter admirado.
Seria esse modelo uma forma de
reduzir o papel do curador na cena das artes plásticas?
"Creio que quando Harald
Szeeman, na Bienal de Veneza
passada, apresentou como última
obra o famoso trabalho de Joseph
Beys "O Fim do Século 20", isso
significou de fato o fim do que
chamo o grande curador, aquele
capaz de impor uma única visão.
É uma ilusão imaginar que eu,
mesmo que viaje por todo o mundo, seja capaz de fazer uma mostra diversa. Como sou encarregado de uma exposição que tem a
pretensão de representar o mundo todo, isso só pode ocorrer se
suas diferenças e contradições estiverem explicitadas. Para tanto,
convidei curadores com posicionamentos muito diferentes e não
interferi nas escolhas feitas."
A crítica de Bonami às mostras
"blockbusters" (feitas para alcançar o grande público) estende-se
também ao museu Guggenheim,
que acaba de fechar o contrato para a construção da sucursal no Rio
de Janeiro. "Há o "dark side" do
Guggenheim e o seu lado positivo.
Thomas Krens [o diretor do museu com sede em Nova York] é
um dos poucos visionários em arte contemporânea. Ele criou um
modelo de museu que vai além de
suas paredes, tornando-se um
símbolo, e isso é seu lado bom.
Mas há o lado negativo, que é a recusa do conteúdo, como ocorre
em Bilbao. O museu lá é uma
grande escultura, mas não há nada dentro e é fundamental que
um museu tenha conteúdo. Eles
estão criando catedrais sem ter fé,
sem saber para qual deus se deve
rezar", afirma o curador.
Bonami esteve nos últimos dois
dias em São Paulo para divulgar o
programa da bienal, primeira vez
que tal fato ocorre. Mas não é foi
só a capital paulista, ou outras
grandes metrópoles como Paris e
Nova York, que Bonami visitou.
Ele tem passado por várias pequenas cidades italianas, como
Pádua ou Trieste, pois uma de
suas missões é ampliar o público
da mostra.
"A Documenta, na Alemanha,
tem uma média de 600 mil visitantes, contra apenas 300 mil em
Veneza. Mas lá 50% do público é
de alemães e nossa bienal tem tido
um caráter mais internacional. Isso é preciso ser revertido", disse o
curador do evento veneziano.
A presença do curador italiano
reflete ainda a presença significativa de brasileiros na mostra.
Além de Rosângela Rennó e Beatriz Milhazes, que representam o
país no evento, indicadas por Alfons Hug, há outros seis artistas
convidados: Hélio Oiticica, Cildo
Meireles, Fernanda Gomes, Marepe e Alexandre da Cunha, na
mostra "A Estrutura da Sobrevivência", organizada por Basualdo, e Rivane Neuenschwander em "Atrasos e Revoluções", curada
pelo próprio Bonami.
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