São Paulo, sexta-feira, 08 de maio de 2009

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Crítica

Astúcia narrativa do criador de "Lost" renova série mítica

Com direção de J.J. Abrams, "Star Trek" reúne atrativos para fãs e para novatos

Divulgação
O ator Chris Pine como o jovem capitão James T. Kirk, em cena cena "Star Trek", filme de J.J. Abrams, que estreia hoje no Brasil

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Assim como na vida existem os compulsivos e, no crime, serial killers, na ficção há criadores cuja mente funciona com base numa lógica serial. Destes faz parte, certamente, o produtor-diretor-roteirista J.J. Abrams. Depois de inventar uma superespiã cujo maior desafio era decifrar a própria genealogia ("Alias") e de recuar à originalidade do fantástico de "Além da Imaginação" com "Lost", Abrams se lançou à aventura do cinema. Mas foi pelo atalho de uma antiguidade da TV que ele chegou à grande tela com "Missão: Impossível 3". Em seguida, reanimou os arquétipos dos monstros televisivos dos anos 50 no subestimado "Cloverfield". Agora, tenta alcançar a fronteira final e consegue trazer o futuro para o presente.
Como na muito frequentada lista de heróis recauchutados para o cinema recente (Homem-Aranha, Batman), Abrams reinventa uma origem para os míticos personagens de "Star Trek", franquia exaustivamente explorada nas gerações e regenerações produzidas para a TV e na série de longas feitos desde fins dos anos 70. O recuo faz parte do procedimento serial, e Abrams sabe que, para funcionar como história, a serialidade exige um ponto de partida e uma progressão.

O filme como um piloto
"Star Trek" desempenha, portanto, a função do piloto, "apagado" da série original e das versões disponíveis em DVD. De "The Cage" (episódio zero do qual já havia "roubado" a abertura da terceira temporada de "Lost"), Abrams extrai o prólogo do filme, no qual recria o passado familiar do capitão Kirk. O diretor nos mostra a infância e a adolescência dele e também a de Spock, o filho mestiço de pai vulcano e mãe humana, e a forma como os dois se conheceram.
Explicadas as origens, o filme se concentra nas aventuras da primeira viagem da tripulação da Enterprise, com Kirk, Spock, Uhura, Sulu, Chekov e Scotty, que juntos enfrentam o malvado Nero, um vingativo romulano e personagem inexistente na série original.
Nessa estratégia de "prequela" não há novidades, apenas a eficiência de promover o encontro de um relato preexistente com dois tipos de público. De um lado, aquele que reencontra seus heróis.
De outro, os que, por serem muito jovens, não conheciam a história ou a consideravam "velharia".
Desse modo, o filme reúne pais e filhos num mesmo público. A opção também proporciona outra vantagem: oferecer aos fãs um prazer arqueológico, mostrando-lhes situações pressupostas, e introduzir o novato num universo complexo, tendo a juventude dos personagens como porta de acesso. Assim, o filme mata quatro coelhos em uma cajadada.

Domínio do ritmo
Essa astúcia narrativa de homem de TV, porém, se completa com um controle rigoroso do ritmo e das ações no filme. É óbvio que cada sobressalto é rigorosamente cronometrado, impedindo o espectador adestrado na velocidade do cinema-game de se entediar.
Com essa visão blockbuster, Abrams define também a imagem, desde as espetaculares vistas gerais da Enterprise até a estrutura dos cenários, a luminosidade constante no lado da Frota Estelar contra a obscuridade arcaica da Narada, nave dos vilões romulanos, que reativa o maniqueísmo que ecoa a geopolítica contemporânea. Ao espectador resta apenas uma escolha: viajar.


STAR TREK

Produção: EUA/Alemanha, 2009
Direção: J.J. Abrams
Com: Chris Pine, Zachary Quinto
Onde: estreia hoje no Anália Franco, Espaço Unibanco Pompeia e circuito
Classificação: 12 anos
Avaliação: bom




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