São Paulo, sexta, 8 de maio de 1998

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LITERATURA
"The Time of Our Time" confirma a condição do autor americano
Mailer é narrador do mal-estar

em Nova York

Gore Vidal, a um só tempo o grande rival (a briga de ambos no talk-show de Dick Cavett em 1971 é um dos deleites de "The Time of Our Time") e o maior companheiro de viagem literária de Mailer, deve estar rindo sozinho. "Ele é todo fragmentos e partes", provocou o autor de "Duluth" num ensaio devastador de 1960. "The Time of Our Time" seria a prova definitiva. De certa forma o é, mas não exatamente da tese maior de Vidal. "Não estou certo, afinal, de que ele deveria ser uma romancista, ou mesmo um escritor, apesar dos dotes formidáveis", sustentava Vidal. A instabilidade ideológica e emocional, a busca irrefreável da fama e a irregularidade da produção ficcional de Mailer justificariam a esnobada. Vidal acertava no transitório e errava no essencial. A fórmula do crítico David Denby num ensaio recente em "The New Yorker" parece mais justa, ainda que algo exagerada no sentido inverso: "Mailer, que é provavelmente o mais aventureiro e esbanjador de talento escritor americano do pós-guerra, saiu de moda quando recusou a ironia e o jogo pós-modernista. Por meio de todas suas mudanças, ele se manteve um cronista social à moda de Balzac e um empenhado patriota, devassador do coração do país". A auto-retrospectiva literária de Mailer revalida a velha fórmula: suas melhores páginas como ficcionista ("Os Nus e os Mortos", "A Canção do Carrasco") estão carregadas do poder de convicção da grande reportagem; seus mais marcantes textos jornalísticos ("Os Exércitos da Noite", "The Fight") cativam o leitor como literatura de rara intensidade. Assumindo erros e acertos, literários e pessoais, "The Time of Our Time" confirma Mailer como um dos maiores narradores do mal-estar americano deste último meio século. Já ninguém espera dele o romance-síntese da civilização "made in USA". Ele ainda promete a versão definitiva de "Harlot's Ghost", a CIA segundo Norman Mailer. Entregue-a ou não, o jovem autor de "Os Nus e os Mortos" pode ter a certeza da missão cumprida. (AMIR LABAKI)



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