São Paulo, quarta-feira, 08 de junho de 2011

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"Sou fácil de amar; conviver comigo é que é impossível"

Em rara entrevista, o músico inglês Ray Davies, criador do The Kinks, lamenta a vida familiar que nunca teve

Famoso há meio século, o tímido cantor diz que gostaria de conservar "um relacionamento casado normal"

RACHEL COOKE
DO "GUARDIAN"

Ray Davies é famoso há quase meio século, mas a experiência parece não tê-lo modificado em quase nada.
Ele ainda vive a pouco mais de um quilômetro do lugar onde nasceu (Fortis Green, na zona norte de Londres). Ainda é amigo das pessoas que conheceu na escola. Davies não gosta de dar entrevistas e o faz relativamente pouco. Mas, se você tem a sorte de ficar a sós com ele, é surpreendido com a grande franqueza com que responde às perguntas.
Quieto e modesto, se confessa "imensamente" tímido. Pergunto como, então, ele consegue criar coragem para subir ao palco. "Acontece: é uma espécie de energia."
Davies dedica agora esta energia ao Festival Meltdown deste ano, evento de South Bank (Londres), voltado para a música eletrônica, do qual é curador.
Em 1964, ele formou o Kinks com seu irmão guitarrista, Dave. "Sim, é realmente um pequeno milagre", diz, com calma. Não que a fama global tenha sido sua meta. "Ainda hoje há quem diga "Ray quem?", e tudo bem."
O choque principal associado à fama foi se dar conta de que ser criativo ocuparia apenas mais ou menos 5% de seu tempo. "Tive que aprender sobre contratos, descobrir como funciona o aparato todo. Odeio isso tudo até hoje. Eu não estava preparado para isso. Fomos apenas a segunda, talvez a terceira geração de roqueiros britânicos."
Davies foi casado três vezes e tem quatro filhas. "Estou entre namoradas. Sou fácil de amar, mas conviver comigo é impossível." Vive melhor sozinho? "Não há nada como ter uma companheira legal. Você quer uma pessoa para a qual possa voltar, quando retorna para casa, e dizer "tive um dia de merda". Isso não vai ajudar com o dia, mas você tem alguém para quem dizê-lo."
E suas filhas? "Essa é a única coisa que lamento realmente em relação à minha carreira -não ter passado mais tempo com elas." Mas as coisas estão melhores agora? "Na verdade, não. Tenho uma filha na Irlanda.
Ela tem 14 anos. Falo com ela quando consigo. Não a vejo há quase um ano, o que é terrível. Eu ia para lá no Natal, mas fiquei doente. Sinto saudades dela. Eu poderia vê-la se quisesse, é apenas que..."
Sua voz diminui e se cala por um instante.
Elas pensam no pai de um jeito "oh, a gente já desistiu do nosso pai?". Davies não responde.
"Eu gostaria de ter podido conservar um relacionamento casado normal. Meu amigo Patrick está com a mesma mulher desde a época da escola. Sinto inveja dele por isso. Ele me mostrou fotos de suas reuniões de família, e há um equilíbrio nisso."

Tradução de CLARA ALLAIN


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