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Gravuras e ilustrações são os destaques
especial para a Folha
Robert Descharnes, curador da
atual mostra do Masp, gosta de
lembrar um bordão inventado por
Dalí sobre si mesmo: o que se conhece em geral do artista representaria apenas "a ponta do iceberg de uma enorme criatividade
submersa".
E a exposição imaginada pelo
francês para o Brasil, dividida em
14 módulos que incluem registros
fotográficos do cotidiano do artista feitos por ele, contribuiria, em
hipótese, para revelar Dalí por inteiro.
Assim, além de "vender" o mito do "artista excêntrico" que
costuma fascinar o público jovem
("todo artista é um pouco louco"), a mostra revela outra coisa:
a metáfora do "iceberg" não passou de blefe desesperado ou golpe
publicitário.
Nunca se conhecerá a "verdadeira criatividade" do artista, a
menos que lhe seja dado um dia
reencarnar.
No entanto, se o espectador da
mostra dispensar o "pacote" que
apresenta o artista como gênio incomparável da raça, pode garimpar na mostra atual dezenas de
imagens instigantes.
As poucas telas do auge da fase
surrealista (anos 30), bastante cuidadas na feitura, conservam frescor e impacto original. Em especial os óleos "Espectro de Vermeer Utilizado Como Mesa"
(1934), "Eu Aos Dez Anos (...)
Criança Gafanhoto" (33), o grafite "O Arco Histórico" (37), e algumas outras obras provenientes
do Museu Dalí de São Petersburgo, Flórida.
Três ou quatro óleos dos anos 20
são impressionantemente cuidados nos detalhes e cores, bem como o famoso retrato de Gala de
costas (45).
Porém, o aspecto melhor contemplado é o do Dalí ilustrador e
gravador. As 42 gravuras feitas em
1934 para o livro "Os Cantos de
Maldoror" merecem atenção, porém é sofrível a qualidade de impressão da série trazida.
Passa-se a um nanquim preciso
nas admiráveis soluções criadas
para ilustrar livros de Maurice
Sandoz, na década de 50 (módulo
"Os Príncipes do Mistério").
Utilizando procedimento de
apropriação típico do Dada e do
Surrealismo, o artista interveio em
cor e forma sobre 50 gravuras da
notável série medieval "Os Sonhos Engraçosos de Pantagruel",
de um erotismo bufo. Os trabalhos
mostrados são originais.
Há, ainda, dezenas de objetos
mais que curiosos, como a ourivesaria em ouro, as esculturas-ânus,
os livros-múltiplos.
Esculturas
Quanto ao que costuma atrair a
maior atenção, as esculturas, é
preciso lembrar que trata-se, na
verdade, de "ready mades" (de
séries de doze) mandados executar pelo artista segundo desenhos
e instruções. Não têm alma.
O pesado "Rinoceronte Rendado", por exemplo, estaria melhor
em qualquer parque de brinquedos, caso suas arestas não ferissem
os pequenos.
(AM)
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