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TELEVISÃO
ACM seduz na TV Cultura
GILBERTO VASCONCELLOS
especial para a Folha
O senador baiano Antônio Carlos Magalhães, indiferente à milenar superstição aziaga em torno
do número 13, resolveu finalmente comparecer -depois de 13
anos de obstinada recusa- ao
programa "Roda Viva" da TV
Cultura de São Paulo, sendo sabatinado por notáveis jornalistas
que o entrevistaram em outras
ocasiões, de modo que o climatério verbal era-lhe familiar e manjado.
Nada de novo ou inusitado nessa longa entrevista que transcorreu monótona e tranquila, com
perguntas e respostas quase agendadas de antemão, não obstante
algumas farpas cordiais trocadas
com o simpático videomaker Roberto D'Ávila, que o interpelou de
"truculento".
Ao que o político do PFL, qualificando-o de "meigo", retrucou:
"Truculento é o Brizola!".
Aí o jornalista, vestido com um
excêntrico paletó à tropicália, sorriu e não demonstrou nenhuma
convicção ideológica trabalhista,
apenas insinuou de leve a existência da problemática separação entre a esfera da política e do jornalismo.
Relação complicada
Para mim, que até então jamais
havia assistido ao sultão baiano
na tela da TV, impressionou-me o
gesto folgado de jogar pastas e
dossiês "verdes" ao chão, lendo-os como quem sente inegável dificuldade em pronunciar as palavras, tal qual só acontece com a
dicção semi-ágrafa.
Nessa relação complicada do
oral com o escrito, acudiu-me a
idéia de que o grande adversário
de ACM na política é a letra, porquanto à oligarquia do Nordeste
sempre faltou um projeto de alfabetização.
A gestuália abusada do califa do
PFL, durante a leitura das pastas e
dossiês, sugeriu-me a imagem de
um droup-out do sistema escolar.
Na verdade o que o comove é menos a educação do que a comunicação.
O espírito da entrevista na TV
Cultura refletiu o desejo do "coronel de resultado" em seduzir o
PSDB e São Paulo: acarajé neles!
Às tantas o ACM social-democrata parecia um niubolchevik de
gauche, teatralmente a favor do
pleno emprego e da reforma agrária.
Nessa performance, supostamente progressista, o imperativo
de encantar o Sudeste significa cebrapizar-se, assim como FHC tivera de cair de boca na buchada
de bode do PFL.
O que é que o ACM tem?
O desafio em atucanar-se como
homem fino e educado no Sudeste é acompanhado pela propaganda turística da Bahia como o
simulacro paradisíaco do Plano
Real, sendo ele entusiasta da regionalidade, mas avesso à noçãode colonialismo, portanto conivente em relação ao déficit crescente de soberania nacional, como se a Bahia fosse uma Angola
independente do resto do Brasil.
Em ACM, tal qual o romancista
Jorge Amado, a ideologia da baianidade funciona como um exercício cultural perverso: é o corpo
exotique da região sem nação.
A sua aposta fordista, respaldada pela pecúnia do BNDES, indispondo-se com Minas Gerais e Rio
Grande do Sul, ensaia uma espécie de replay cepalino de Jotaká na
Bahia: a façanha automobilística
do 50 anos anos em 5.
Com isso, a ponta de lança do
candidato do PFL à Presidência
da República, o mumbo-jumbo
do Anfavea, dependerá da vontade política do capital alienígena.
Gilberto Felisberto Vasconcellos é professor de ciências sociais na Universidade Federal de Juiz de Fora (MG) e autor de "O Príncipe da Moeda" (Ed. Espaço e Tempo), entre
outros.
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