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CRÍTICA
Brasileiros levam show, rito e caixa
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
Uma das três amostras de Brasil
em Avignon, "Pernambuco", que
estreou no fim-de-semana no
Sesc Belenzinho, é um cartão-postal de Recife. Para quem se
deixou tocar pelo Tonheta de
"Brincante", há seis anos, este
"pot-pourri" de shows de Antônio Nóbrega, com especial atenção a ritmos carnavalescos, soa
ofensivo.
Estão lá duas cenas de Tonheta,
seu personagem meio Arlequim
meio Piolim, mas Nóbrega nem
parece o mesmo das peças, sem
dar vida ao papel, em cenas que
destacam Rosane Almeida. Está
mais à vontade, é flagrante, como
crooner/regente de sua imensa
orquestra "popular".
Pela seleção musical, pela "aula" de história da arte, pelo tímido
maracatu e pelo bumba-meu-boi
de circo, lembra um espetáculo
folclórico. Mas é mais: com frevo
e Carnaval, aliás muito bem executado, é um show para turistas,
ou ainda, para francês ver.
Da idéia de uma seleta de canções até o título "Pernambuco"
ou "Pernambouc", quase cabotino por sugerir que representa um
Estado inteiro, o espetáculo é todo ele uma encomenda do festival
-o que ajuda a entender o exotismo à la Parintins.
Melhor e até mais representativo é o "Auto da Paixão", de Romero de Andrade Lima, não por
coincidência também o diretor de
"Brincante" -e que estreou as
duas encenações na mesma época, 92/93, o que mostra como está
atrasado o festival.
É um espetáculo ritual que
acompanha a Paixão de Cristo. O
corifeu e um coro de "pastorinhas", vestidas de branco e com
certa carga sensual, fazem uma
procissão que passa por obras do
também artista plástico Andrade
Lima, enquanto cantam músicas
nordestinas.
São "12 Cânticos de Amor e
Morte", no subtítulo esclarecedor, pontuados por algumas cenas farsescas de inspiração religiosa, até com perna de pau.
Estranhamente, "Auto da Paixão" não foi pensado como teatro
e sim como uma maneira de lançar uma exposição de Andrade
Lima, numa galeria. Mas o impacto foi tal que volta quase todo ano,
com viagens ao exterior.
Por fim, o terceiro representante brasileiro é o grupo Caixa de
Imagens, que leva a Avignon as
suas cenas com marionetes mínimas. O espectador solitário se
senta diante da caixa com tripé,
que parece de algum velho fotógrafo de praça, olha pelo buraco e,
por alguns minutos, chega a maravilhar-se com os personagens,
seus movimentos, as pequenas
histórias.
São imagens encantadoras, como na cena "Em Algum Lugar do
Passado", precisamente sobre um
daqueles velhos fotógrafos.
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